Jeferson Miola: Cúpula militar não aceita controle do poder civil

Cúpula militar não aceita controle do poder civil

Por Jeferson Miola, em seu blog

No mesmo pronunciamento para seus comandados ainda no Comando Militar do Sudeste [janeiro/2023], quando afirmou que a vitória do Lula “infelizmente foi o resultado que, para a maioria de nós, foi indesejado, mas aconteceu”, o general Tomás Ribeiro Paiva, atual comandante do Exército, também defendeu a prioridade de “obstar qualquer tipo de tentativa de querer nos jogar para o enquadramento”.

No vídeo do pronunciamento, editado profissionalmente com fundo musical e propositalmente vazado, o general Tomás fez um discurso milimetricamente calculado para servir de música aos ouvidos do governo e das instituições civis.

Com aquela “peça de propaganda”, a cúpula militar preparou o caminho para a escolha dele para o posto mais alto do Exército brasileiro.

O general Tomás, o prodígio do general Villas Bôas, foi a alternativa construída dentro da caserna com o objetivo de “tudo mudar para que tudo continue exatamente como está”.

Por aqueles dias, o presidente Lula cogitava a demissão do general Júlio César Arruda do Comando do Exército devido à escancarada cumplicidade do comandante bolsonarista com o acampamento de criminosos no QG do Exército e com os atentados de 8 de janeiro.

Não por acaso, o vídeo foi vazado na noite de sexta-feira, 20 de janeiro de 2023, véspera do anúncio da demissão do general Arruda.

Na ocasião, a cúpula do Exército vazou apenas os trechos nos quais um [falso] legalista e [falso] profissional general Tomás fazia loas à legalidade, à necessidade de profissionalizar as Forças Armadas e de afastar os militares da política.

No entanto, os conteúdos problemáticos das declarações do general Tomás, como o lamento dele com a vitória do presidente Lula na eleição, foram estrategicamente ocultados. Esses trechos somente começaram vir a público a partir do final de fevereiro.

A Folha divulgou [17/4] a parte do discurso em que o general Tomás se habilita a ser um comandante comprometido a empregar sua “força política […] para obstar qualquer tipo de tentativa de querer nos jogar para o enquadramento”.

“Faz parte da cadeia de comando segurar para que isso [a reformulação das Forças Armadas] não ocorra”, ele discursou.

E, presumivelmente referindo-se ao desgaste dos militares com o fracasso da intentona fascista-militar de 8 de janeiro, afiançou que “agora fica mais difícil, mas nós vamos segurar, porque o Brasil precisa das Forças Armadas”.

Na esteira da estratégia do Exército para impedir o “enquadramento” e controle dos fardados pelo poder civil, a Força Terrestre escalou o general Silva Neto para fazer lobby no Congresso com o objetivo de pressionar parlamentares a não interferirem nos interesses corporativos e da chamada família/partido militar.

Em reportagem, a Folha destaca que “em avaliação interna, militares acreditavam que o Congresso poderia entabular discussões sobre o papel das Forças Armadas diante do envolvimento político da caserna com o governo Bolsonaro”.

Os comandantes militares decidiram, então, repetir a estratégia empregada durante o processo constituinte, quando tutelaram e controlaram a transição conservadora da ditadura à democracia tutelada.

O jornal reporta que “uma das funções iniciais de Silva Neto, segundo relatos, será a de entender se há possibilidade de aprovação de uma PEC do PT para alterar o artigo 142 da Constituição”.

Eles se opõem, de modo indevido e ilegal, à retirada das operações de GLO [Garantia da Lei e da Ordem] das atribuições das Forças Armadas.

O general Silva Neto também terá a responsabilidade de “coordenar estratégias para conseguir emendas ao Orçamento para as despesas do Exército”, o que em outras palavras significa não só manter, mas também aumentar o fardo pesado que as Forças Armadas representam para o Tesouro Nacional.

A escalação de um general lobista para pressionar e emparedar o poder político, ou seja, o Congresso Nacional, é paradigmática da realidade de incompatibilidade das cúpulas partidarizadas das Forças Armadas com a democracia.

Os militares, em grande parte conspiradores, não aceitam ser “enquadrados” pelo poder civil, como corresponde acontecer em qualquer democracia séria.

Cabe ao ministério da Defesa, e não aos comandantes das três Forças ou a subordinados designados por eles, o diálogo e a representação institucional perante o Congresso.

De outra parte, se algum general é liberado para fazer articulação política e parlamentar ao invés de ser designado para coordenar tropas ou áreas do Exército, então fica evidente que a continuidade de tal general no próprio Exército é dispensável.

A sociedade brasileira está diante da melhor oportunidade dos últimos 50 anos para enfrentar resolutamente a questão militar no Brasil.

O desaproveitamento desta oportunidade devido a uma postura de leniência com a autonomia e insulamento dos militares como se fossem um governo dentro do governo, ou um partido político dentro da arena política, pode cobrar o preço da destruição final da já débil e ameaçada democracia.

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Publicação de: Viomundo

Lunes Senes

Colaborador Convidado

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