Entidades lançam manifesto contra projeto de Bolsonaro que regula atividade de lobby: Limita demais participação social

Organizações da sociedade civil lançam manifesto contra projeto de lei que limita participação e representação social

Confira o manifesto na íntegra

Por Assessoria de Comunicação do Cimi

Previsto para apreciação na tarde desta terça-feira (22) na Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei (PL) nº 4391/2021, o “PL do Lobby”, de autoria do Poder Executivo e apensado ao PL 1202/2007, ameaça a atuação de grupos e organizações que pressionam e questionam a atividade do Legislativo, Executivo e Judiciário.

Seu conteúdo constrange o direito à participação e manifestação social junto a órgãos do poder público ao prever penalidades àqueles que criticam medidas e atos governamentais.

Mais de 60 organizações assinam o manifesto e expressam desacordo com o momento da apreciação, “ao apagar das luzes da legislatura e do atual governo” e reivindicam maior transparência e debate na criação de mecanismos que regulamentam o exercício de suas atividades em decisões públicas. O PL viola direitos constitucionais e fere princípios democráticos.

Leio o manifesto na íntegra:

PROJETO DE LEI (PL DO LOBBY) QUE RESTRINGE A PARTICIPAÇÃO DA SOCIEDADE NA ESFERA PÚBLICA NÃO PODE SER PAUTADO AGORA

No apagar das luzes da legislatura e do atual governo, está na pauta da Câmara dos Deputados o Projeto de Lei (PL) nº 4391/2021, de autoria do Poder Executivo, que regula a representação de interesses privados e da sociedade civil junto a agentes públicos, atividade conhecida como lobby.

Apesar de ser um tema que necessita de regulamentação legal e de ser discutido há quase três décadas no Legislativo, o conteúdo do “PL do Lobby” e a urgência com que se pretende apreciá-lo em plenário, neste momento, trazem ameaças graves ao direito à participação social junto ao Legislativo, Executivo e Judiciário.

O último substitutivo prevê penalidades que vão da multa à suspensão do direito de participação em fóruns públicos, para condutas como “constranger ou assediar participantes de eventos” ou “deturpar o teor de dispositivo de lei, de nota técnica ou ato de autoridade”.

São infrações altamente subjetivas, que permitirão a qualquer autoridade que se sinta contrariada com o posicionamento ou o questionamento de uma organização da sociedade civil abrir um procedimento administrativo e penalizar aqueles que a criticarem ou a seus aliados.

Da forma como está, portanto, o substitutivo limita severamente o direito democrático de participação e manifestação da sociedade civil, o que contraria não só a Constituição, como tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário.

Diversos setores da sociedade e parlamentares tentaram corrigir os equívocos da proposta. Persistem, no entanto, as principais ameaças ao acesso e à participação social, à transparência e controles contra a corrupção e, assim, ao exercício da democracia.

As comissões temáticas da Câmara pertinentes ao tema sequer tiveram oportunidade de apreciar devidamente a matéria, ouvir a sociedade e analisar as implicações das regras propostas.

Causa ainda mais receio a eventual aprovação do projeto no contexto do final do atual governo, que, durante quatro anos, atuou fortemente para extinguir e esvaziar os espaços institucionais de participação social, como o Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) e o conselho gestor do Fundo Amazônia, a serem recompostos por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF).

O projeto mantém graves lacunas sobre a isonomia, ao estabelecer regras idênticas para setores com características diversas e que defendem direitos e interesses completamente diferentes, igualando a representação de interesses econômicos aos defensores de interesses individuais homogêneos, difusos e coletivos.

A natureza indivisível do bem jurídico relacionado aos interesses de defesa do meio ambiente equilibrado ou dos direitos humanos, por exemplo, não pode ser equiparada à representação profissional ou de interesses privados.

O PL também desconsidera as diferentes capacidades financeiras, políticas, técnico-administrativas e de influência existentes entre os múltiplos setores da sociedade, no exercício de seus direitos de representação junto aos poderes públicos, especialmente no Legislativo.

Uma penalidade aplicada sobre uma organização sem fins econômicos, indígena ou quilombola, por exemplo, não teria o mesmo impacto caso feita sobre uma instituição dos setores industrial, da mineração ou do agronegócio.

Além disso, alguns grupos privados têm meios e mecanismos de articulação diferentes para exercer sua influência e fazer valer seus interesses, não exatamente por meio das atividades de lobby que o PL propõe regular.

Uma legislação equilibrada deveria equiparar o acesso de diferentes atores sociais aos poderes constituídos, considerando as desigualdades existentes entre eles, e estabelecer regras e procedimentos específicos para cada contexto, estimulando a participação social, o pluralismo de ideias e limitando a hegemonia de interesses privados e individuais nas esferas públicas.

Entretanto, o controle estatal que se propõe no projeto não torna o processo mais transparente e impessoal. Pelo contrário, tal controle configura ameaça direta aos mais basilares princípios democráticos.

Cremos que esse não é o momento adequado, nem a forma ideal de pautar uma matéria de importância tão estratégica. A tão necessária regulamentação do lobby não deve ser feita de forma apressada e anacrônica pela Câmara dos Deputados, desconectada da conjuntura do novo governo e do novo Parlamento eleitos, especialmente diante das graves ameaças à participação da sociedade previstas nos substitutivos apresentados até o momento.

O Congresso deve ser um espaço onde a participação popular é incentivada, estimulada, e não restringida. O STF já decidiu que “a livre discussão, a ampla participação política e o princípio democrático estão interligados com a liberdade de expressão, tendo por objeto não somente a proteção de pensamentos e ideias, mas também opiniões, crenças, realização de juízo de valor e críticas a agentes públicos, no sentido de garantir a real participação dos cidadãos na vida coletiva. São inconstitucionais os dispositivos legais que tenham a nítida finalidade de controlar ou mesmo aniquilar a força do pensamento crítico, indispensável ao regime democrático”.

As organizações que assinam este documento defendem a existência de mecanismos claros e transparentes de exercício da participação e do controle social das atividades e decisões públicas, reduzindo as desigualdades de representação existentes e estimulando essa participação.

Estamos dispostos a enfrentar esse debate e buscar soluções de forma franca e colaborativa no próximo período legislativo, com a seriedade e a profundidade que o tema merece e o Brasil precisa.

Organizações Signatárias

  • 350.org Brasil
  • Aliança Nacional LGBTI
  • APIB – Articulação dos Povos Indígenas do Brasil
  • Associação Civil Alternativa Terrazul
  • Associação Brasileira de Famílias Homotransafetivas (Abrafh)
  • Associação Mais LGBT
  • Associação Mulheres na Comunicação
  • Associação para a Gestão Socioambiental do Triângulo Mineiro
  • Associação Wyka Kwara
  • Católicas pelo Direito de Decidir
  • CDDH Dom Tomás Balduíno de MARAPÉ ES
  • Centro Burnier Fé e Justiça
  • Centro Dom Helder Câmara de Estudos e Ação Social (CENDHEC)
  • Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea)
  • CESE – Coordenadoria Ecumênica de Serviço
  • Coding Rights
  • Coletivo Arewá
  • Coletivo Digital/SP
  • Coletivo EMPODERA!
  • Coletivo Feminista Classista Maria vai com as Outras
  • Comissão Pastoral da Terra
  • Comitê Nacional em Defesa dos Territórios Frente a Mineração
  • Conectas Direitos Humanos
  • Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (CONTAG)
  • Conselho Indigenista Missionário (Cimi)
  • Criola
  • Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais (FBOMS)
  • Fórum da Cidadania de Santos
  • Fórum de Direitos Humanos e da Terra MT
  • Freeland-Brasil
  • Frente de Mulheres Negras do Distrito Federal
  • Frente Parlamentar Mista em Defesa dos Direitos dos Povos Indígenas
  • Gambá – Grupo Ambientalista da Bahia
  • Greenpeace Brasil
  • Grupo Dignidade pela Cidadania
  • Inesc – Instituto de Estudos Socioeconômicos
  • Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase)
  • Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec)
  • Instituto Brasileiro de Diversidade Sexual (Ibdsex)
  • Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD)
  • Instituto de Referência Negra Peregum
  • Instituto Democracia e Sustentabilidade (IDS)
  • Instituto Gaia Escola
  • Instituto Kabu
  • Instituto Não Aceito Corrupção
  • Instituto Soma Brasil
  • Instituto Talanoa
  • International Rivers – Brasil
  • Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social
  • IROHIN Centro de Documentação, Comunicação e Memória AfroBrasileira
  • ISA – Instituto Socioambiental
  • ISPN – Instituto Sociedade, População e Natureza
  • LBL – Liga Brasileira de Lésbicas
  • Mater Natura – Instituto de Estudos Ambientais
  • Médicos Sem Fronteiras.
  • Movimento Camponês Popular
  • Movimento de Meninos e Meninas de Rua de Goiás
  • MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
  • NOSSAS
  • Observatório do Clima
  • Pacto pela Democracia;
  • Projeto Saúde e Alegria
  • SOS Mata Atlântica
  • Terra de Direitos
  • Transparência Brasil
  • Uma Gota no Oceano
  • WWF-Brasil

Publicação de: Viomundo

Lunes Senes

Colaborador Convidado

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