Papa e Lula fecham pacto contra desigualdade

Foto: AFP

Passando a régua, de tudo o que aconteceu esta semana na viagem de Lula à Europa, incluindo a consagração popular no emocionante show de música em frente à Torre Eiffel, o mais emblemático foi o fortalecimento da parceria do presidente brasileiro com o papa Francisco, simbolizado no beijo e no abraço de urso dos dois ao se encontrarem mais uma vez no Vaticano. É esta a imagem que vai passar para a História destes anos 20 do século 21, no momento em que o mundo se vê às voltas com tantas guerras e desencontros pela vida entre os países, e dentro deles.

Nenhum dos dois faz parte do Conselho de Segurança da ONU, mas juntos eles podem fazer muito mais pela paz e justiça social do que todos os que estão lá dentro. Mais do que tanques e bombas, é isso que pode mudar o destino do mundo para melhor. Essa imagem vai muito além de uma identidade de princípios e propósitos. É esse encontro de almas que nos faz recobrar a fé nos rumos da humanidade. Não é pouca coisa, não é um fato banal, perdido no meio do noticiário das buscas pelos náufragos do submarino trapalhão. Com origens, ofícios e histórias de vida tão diferentes, esses dois estadistas latino-americanos ocuparam o espaço deixado pela carência de lideranças mundiais, respeitados que são em todos os países associados à ONU, a instituição que vem perdendo força na resolução de conflitos, levando a multidões de refugiados, perdidos nos mares, em busca de comida, teto e trabalho. Quem me chamou a atenção para essa fotografia carregada de simbolismos foi a jornalista Ruth de Aquino, minha contemporânea de Jornal do Brasil, no seu pungente artigo “O beijo de Lula no Papa Francisco”, publicada quinta-feira, no Globo. No primeiro parágrafo, que reproduzo abaixo, ela resumiu tudo o que eu também senti e pensei ao ver aquela foto emblemática. “O Brasil está grudado no julgamento de um fascista, que se esmerou em tentar destruir tudo, democracia, voto, paz, floresta, indígenas, saúde e até o caráter nacional. Mas o personagem da semana é outro, Felizmente, Luiz Inácio Lula da Silva, 77 anos, reeleito presidente apesar das violentas tentativas de fraude e golpe de Estado. Lula e seu belo e afetuoso encontro com Francisco, o sumo pontífice. Pontífice, segundo reza o consenso geral, vem do Latim pons (ponte) e facere (fazer). Foi um encontro entre dois construtores de pontes”. É exatamente isso que eles são, construtores de pontes. Apesar de todo o desencontro e desesperança que os cerca, num mundo cada vez mais injusto, egoísta e desigual, os dois não desistem de pregar a paz e a justiça, oferecendo-se para mediar os conflitos, por mais que sejam chamados de sonhadores utópicos. No dia em que ninguém mais acreditar que isso é possível, aí sim, estaremos desgraçados como humanidade, perderemos as esperanças num mundo mais fraterno. Deus sabe o que faz, como se costuma dizer, ao promover esse encontro no Vaticano, que seria inimaginável poucos anos atrás, quando decretaram a morte política de Lula, o sertanejo das mil vidas, preso por 580 dias na masmorra da República de Curitiba, que insiste em desafiar os poderosos. Nas voltas que a vida dá, quis o destino que o papa e o presidente brasileiro se encontrassem na mesma semana em que o antecessor Jair Bolsonaro seria levado a um primeiro julgamento, pelo conjunto da obra de destruição do país, e Sergio Moro fosse desmoralizado na sabatina do Senado, que levou Cristiano Zanin, o advogado de Lula, justamente aquele que o desmascarou na Lava Jato, a ocupar a cadeira, tão sonhada pelo ex-juiz, no Supremo Tribunal Federal. O maior feito de Lula nestes primeiros seis meses de terceiro governo foi devolver aos brasileiros a autoestima, a dignidade, o orgulho e o caráter nacional, sequestrados pelos impostores civis e militares que tinham transformado o Brasil num país pária, rejeitado e humilhado pelo resto do mundo civilizado. Como escreveu Ruth de Aquino: “`Habemos´ presidente da República. O Brasil é novamente respeitado, pela defesa da dignidade humana”. Vida que segue.

Uol  

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