Principal associação dos Yanomami diz que drama de aldeia incendiada não é isolado: “O garimpo invade todo o nosso território; nossas mulheres e crianças estão sendo violentadas”

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Redação

Reportagem dos jornalistas João Gabriel e Fabio Serapião, publicada nesta sexta-feira, 06-05, na Folha de S. Paulo revela que alguns yanomami supostamente desaparecidos após confronto com garimpeiros em Roraima foram encontrados.

Foi o que informou Júnior Hekurari Yanomami, presidente do conselho Distrital de Saúde Indígena Yanomami e Ye’kwana (Condisi-YY), em depoimento à Polícia Federal nessa quinta-feira, 06-05.

Foi o próprio Júnior Hekurari que denunciou o desaparecimento de um grupo de 24  indígenas da Comunidade Aracaçá, na terra indígena Yanomami (RR), no dia 25 de abril.

A Comunidade Aracaçá foi encontrada queimada e vazia após as denúncias de que uma menina yanomami de 12 anos teria sido sequestrada, estuprada e morta por garimpeiros.

Segundo o relato de Hekurari à PF, os indígenas que moravam na comunidade de Aracaçá se mudaram para outros locais da terra indígena e parte deles reside agora em uma comunidade chamada Palimiú.

Após a denúncia, a Polícia Federal esteve na terra indígena e disse não ter encontrado indícios do crime. A conclusão foi divulgada em nota assinada pelo Ministério Público Federal, pela Funai (Fundação Nacional do Índio) e pela Secretaria Especial de Saúde Indígena.

A investigação sobre o caso, no entanto, segue em andamento.

NOTA PÚBLICA DA HUTUKARA ASSOCIAÇÃO YANOMAMI SOBRE O DESAPARECIMENTO DA COMUNIDADE SANOMÃ DE ARACAÇÁ

Nesta sexta-feira, devido à grande repercussão do caso, a Hutukara Associação Yanomami (HAY) divulgou uma nota pública (na íntegra, ao final) sobre desaparecimento dessa comunidade indígena.

Segundo a nota, nos últimos dias, a HAY vem tentando reconstruir os eventos denunciados pelos yanomami.

“Embora não tenha reunido informações suficientes para esclarecer a ocorrência ou não do crime denunciado,  recolheu informações que revelam um grave histórico de tragédias associadas ao garimpo na comunidade”,  salienta.

Segundo a nota, a HAY entrevistou ao longo desta semana parentes [é como os indígenas se referem aos demais] que vivem próximos à região de Aracaçá e uma idosa da comunidade que está na cidade de Boa Vista para receber atendimento médico (o negrito é do original):

As informações obtidas até o momento confirmam o cenário desolador vivido pela comunidade a partir das relações impostas pelo garimpo, com reiterados depoimentos de violência sexual em série

Até o momento fossível levantar que o histórico de tragédias na comunidade começou em 2017, com a morte de um homem conhecido como C. Sanumá. É filho da idosa em tratamento médico em Boa Vista.

C.  foi morto durante uma briga, fomentada pela distribuição de cachaça por garimpeiros aos indígenas.

C. tinha duas esposas. Após a morte dele, elas ficaram em situação de extrema vulnerabilidade, sendo prostituídas nos acampamentos de garimpo.

A segunda esposa, chamada pelos yanomami de W., morreu em seguida.

Na sequência, K., uma das filhas de C. Sanumá com sua primeira esposa, foi levada para se prostituir em um acampamento de garimpeiros próximo a Aracaçá.

K. tinha 16 anos. Era explorada sexualmente pelos garimpeiros, que a obrigavam a manter relações sexuais com duas pessoas ao mesmo tempo.

Após perder um bebê e ficar com graves sequelas devido à violência sexual, K. engravidou de um garimpeiro chamado Pastor. Quando a criança nasceu, Pastor levou-a embora. E K. se enforcou.

A nota da HAY destaca (negrito é do original):

A sequência de tragédias que marcaram a marcaram a família de C. demonstram que na aldeia de Aracaçá há casos generalizados de abusos e violência. 

A vulnerabilidade das pessoas da comunidade é tamanha que é bastante próvavel que episódios assim se repitam cotidianamente. 

(…)

O drama vivido pela comunidade de Araçaçá não é fato isolado na terra indígena Yanomami.

Em todo o território, o garimpo invade nossas terras, o nosso modo de vida, nossas roças e gera fome e violência. Nossas mulheres e crianças estão sendo violentadas recorrentemente em diversas regiões assoladas pelo garimpo. Nossas famílias estão adoecendo e morrendo de doenças facilmente tratáveis. Nossos jovens estão morrendo da violência das armas de fogo trazidas pelos garimpeiros.

Ao final, a nota da HAY responsabiliza a União pelo que está acontecendo:

Se a união estivesse cumprindo a decisão judicial do Tribunal Regional Federal da 1ª região que, desde 2020, determinou a retirada dos garimpeiros Ilegais das nossas terras, muitas das tragédias sofridas pelos ianomâmi estariam sendo evitadas.

Abaixo, a íntegra da nota.

Publicação de: Viomundo

Lunes Senes

Colaborador Convidado

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