Diversidade marca ato pró-democracia

Foto: Tiago Queiroz/Estadão

Os atos na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo nesta quinta-feira, 11, foram marcados pela diversidade nos rostos que deram cara a uma boa parte da iniciativa em defesa da democracia. Em 1977, quando a carta aos brasileiros foi lida por Goffredo da Silva Telles Júnior nas Arcadas, o cenário era outro. O primeiro ato teve uma lista de oradores dividida de forma equilibrada entre homens e mulheres. Beatriz Lourenço do Nascimento foi uma das que discursaram para a plateia de 800 pessoas. Presidente da Coalizão Negra por Direitos, Beatriz foi aplaudida ao dizer que “enquanto houver racismo não haverá democracia” e que “qualquer projeto ou articulação por democracia no País exige o firme e real compromisso de enfrentamento ao racismo”.

A socióloga Neca Setúbal condenou o racismo no seu discurso e defendeu o combate à violência contra minorias. “Só com a democracia que nós vamos ser capazes de enfrentar as desigualdades sociais enormes que nós vivemos e que são atravessadas pelo racismo, pela violência de gênero contra as mulheres e contra a comunidade LGBTQI+.”, afirmou.

O ato contou com discurso da primeira presidente negra da União Nacional dos Estudantes, Bruna Brelaz. “A democracia vai vencer, e nenhum ser humano desprezível vai derrotá-la”, afirmou Bruna, da tribuna do salão. “Não aceitamos as sanhas de uma tentativa de golpismo que flerta com o esgoto mais sombrio de nossa história”, disse.

No pátio interno, o segundo momento da manhã foi conduzido e protagonizado majoritariamente por mulheres. A mestre de cerimônias foi a atriz Roberta Estrela D’Alva, que chamou ao palco a presidente do Centro Acadêmico XI de Agosto, Manuela Morais – a única a citar nominalmente Jair Bolsonaro e a primeira a arrancar manifestações da plateia contra o chefe do Executivo.

O nome de quem faria a leitura da “Carta às Brasileiras e aos Brasileiros” nas Arcadas foi uma das poucas informações que não circularam com antecedência. A ideia da organização era surpreender. Inicialmente, seria lida pelo ex-ministro do Supremo Tribunal Federal Celso de Mello, que não pôde comparecer por motivo de saúde. Em vez de convidar outro ex-integrante da Suprema Corte para a iniciativa, a organização decidiu que o texto seria lido por mulheres. Três dividiram a leitura da carta com Flávio Bierrenbach, um dos articuladores do movimento de 1977.

Eunice de Jesus Prudente, professora da Faculdade de Direito da USP e da Faculdade Zumbi dos Palmares, começou sua apresentação aplaudida ao se descrever – ato adotado pelos quatro presentes como forma de ampliar a compreensão de deficientes visuais. “Sou uma mulher preta, cidadã brasileira, negra, uso símbolos importantíssimos das comunidades e das religiões de matriz africana. Estou vestida de amarelo, uma das cores do meu santo, Oxum”, disse Eunice, a primeira a começar a leitura do texto. Falaram, na sequência, a professora Maria Paula Dallari Bucci, Bierrenbach e, por fim, a professora Ana Elisa Bechara, vice-diretora da Faculdade de Direito da USP. Celso Campilongo, diretor da faculdade, fez um discurso no palco, mas não foi um dos leitores do manifesto.

Apesar do esforço para garantia da diversidade, a imagem do palco do salão nobre da faculdade, que reuniu notáveis do mundo jurídico e empresarial, mostra que ainda é desigual a presença de mulheres e de negros nos espaços de poder. O palco foi composto majoritariamente por homens brancos. É onde estavam sentados, por exemplo, os presidentes da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e da Federação Brasileira de Bancos (Febraban) e os ex-ministros Celso Lafer e Fernando Haddad. A Faculdade de Direito da USP só teve uma mulher como diretora até hoje, dos 43 que já ocuparam a cadeira. O perfil dos alunos da USP – e da Faculdade de Direito –, no entanto, tem se tornado mais diverso desde a adoção do modelo de cotas.

Estadão  

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