Lelê Teles: Há mestres e víboras; a todos com carinho
Por Lelê Teles*
hoje é o dia do professor e da professora.
tenho muitos amigos professores e muitas amigas professoras, e tive muitos professores amigos.
ministrei aulas por sete anos em escolas públicas em Brasília e em cursinhos pré-vestibulares privados.
tive milhares de alunos.
meu caráter e minha formação intelectual foram moldados por grandes mestres que cruzaram o meu caminho e dele nunca mais saíram, um mestre é pra vida toda.
dito isso, digo mais: tive muitos professores ruins, estudei com muito professor picareta; na sétima série, uma junta de professores me expulsou da escola pública.
meu crime: hiperatividade, contestação aos textos escritos, incitação à recusa coletiva ao uniforme escolar comprado pelos pais de um fornecedor que ninguém havia escolhido, formação de um grêmio livre (era ’83/’84 amigo), insurgência às aulas cívicas, negação, contestação, protesto.
montei uma banda punk na escola.
à época, os professores educavam cordeiros por coação, todos sentadinhos até o último horário: “pra falar levante o dedo”, “traga-me uma maçã”, “vou te botar de castigo”, “vou chamar a diretoria”, “vou te reprovar”…
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assim, tosquiavam os cordeiros, todos cabisbaixos, emudecidos, adestrados, genuflexos.
na minha época ainda se aplicava o castigo, não mais físico, mas psicológico; advertências orais aos alunos e escritas aos pais, castigo na coordenação, tirar pontos para a prova seguinte.
ameaças, tortura psicológica, autoritarismo.
eu disse não.
me ejetaram.
eu, que sempre tirei as melhores notas na escola; eu, que substituí o professor de inglês, ainda na sétima série, por duas semanas.
eu, que já lia livros, escrevia músicas, poesias e cantava.
eu que tanto amava a escola.
expulso, degredado, defenestrado.
trabalhei no Banco do Brasil, paguei escola, passei na UnB, me tornei professor de inglês ao 23 anos, e fui dar aulas justamente na escola que havia me expulsado.
ao entrar na sala dos professores eu disse: “não reconheço nenhum de vocês como mestres, se pudessem teriam destruído a minha vida. raça de víboras”.
no entanto, sigo amando a escola e reconhecendo a sabedoria dos mestres e com eles sempre aprendendo.
mas sempre com um pé atrás, como me ensinou o mestre de capoeira, no gingado.
palavra da salvação.
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