Pretos e pardos têm menos terra e estão mais vulneráveis a insegurança fundiária
Embora mais da metade dos produtores rurais que praticam a agricultura familiar no Brasil se declarem pretos ou pardos, essa população tem acesso a menos terra, está mais sujeita a produzir em locais não regularizados e conta com menor acesso a políticas de crédito. A conclusão é baseada nos dados de um novo módulo do Censo Agropecuário 2017, divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) nesta semana.
A população autodeclarada branca representa 45,43% do total. Dentro desse percentual, 79% possuem terras que somam 10 mil hectares ou mais. A Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq) destaca a informação em contraste à realidade da população rural negra. Quase 70% dos agricultores pretos ou pardos possuem uma área menor que 0,1 hectare, o que corresponde a menos de 1 mil metros quadrados.
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“É o primeiro Censo Agro que traz o recorte de cor, o recorte raça. Com isso conseguimos perceber que, durante todo o processo de formação desse país, houve uma inversão de valores no que se trata do respeito e valorização dos agricultores familiares, negros e quilombolas”, afirma Antônio João Mendes, coordenador executivo Conaq.
Segundo ele, é essencial levar em consideração o acesso precário a financiamento e as questões fundiárias. “Nós, como representação das comunidades quilombolas, sempre falamos que as comunidades quilombolas produzem alimento em pouco espaço de terra e sem a garantia da estrutura financeira para essa produção. A outra coisa que nós sempre falamos é que nós produzimos alimento para a sociedade, para matar fome das pessoas.”
É possível concluir que a maior parte dos trabalhadores rurais pretos e pardos atua na agricultura familiar, levando-se em consideração que commodities do agronegócio como soja, milho e carne ocupam grandes extensões de terras.
Os dados do IBGE apontam que essa parcela da produção do campo é a que mais cresce. Houve redução de 34% da área utilizada para lavouras permanentes e 14% daquela destinada a lavouras temporárias.
O primeiro grupo é composto por plantação de espécies que produzem por anos, a exemplo de algumas frutíferas. Já as produções temporárias também englobam alimentos, como o feijão e o tomate, mas é nesse grupo que estão soja e milho, por exemplo.
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Respectivamente, as duas culturas tiveram um incremento de 123% e 56% na produção, entre 2006 e 2017. O censo também identificou redução de 18% da área de pastagens naturais, e crescimento de 10% da área utilizada para pastagens plantadas.
Jhonny Martins de Jesus, coordenador da Conaq, afirma que dar condições para a produção quilombola impacta positivamente no combate à fome no Brasil. Segundo ele, o trabalho é feito de ponta a ponta pelos pequenos produtores, da produção à comercialização, passando pela administração. Um ativo humano, que nas palavras de Martins, precisa ser valorizado.
“Nós vendemos o que nós comemos. Quando eu mando esse produto para uma feira, é aquele produto que eu tenho coragem de botar na minha mesa. O agricultor extensivo planta, mas ele não come. Ele não pega uma panela, colhe a soja, coloca na panela e come. O presidente Lula disse isso em um debate. O grande empresário do agro não como o que produz. Nós comemos o que produzimos. Inclusive, ele tem que vir buscar da gente.”
Publicação de: Brasil de Fato – Blog