Governo Lula não terá ideologia oficial
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Eduardo Guimarães
Ao longo do século 20, consolidou-se, entre a Comunidade das Nações, o entendimento de que, ao tomarem posse, os governantes de países democráticos devem encerrar as disputas político-ideológicas da campanha eleitoral e governar para todos. Lula fez isso lá em 2003.
Não se trata de ideologia ou de particularidade de um ou outro político, a Constituição é que impõe que os vencedores de qualquer eleição têm que governar para o conjunto do eleitorado. Eis por que, no discurso da vitória, em 30 de outubro, Lula prometeu “governar para 215 milhões de brasileiros”.
Jair Messias Bolsonaro violou esse cânone democrático-republicano. Já no discurso da vitória, na noite de 28 de outubro de 2018, prometeu perseguir adversários político-ideológicos e anunciou uma ditadura da maioria ao afirmar que os eleitores minoritários teriam que “se adequar” aos desejos dos eleitores majoritários.
Ora, democracia não pode ser a ditadura de uma maioria eventual como anunciou Bolsonaro naquela noite fatídica. Democracia prevê governo da maioria que respeita e reconhece os direitos da minoria.
Um outro nome para esse conceito é verniz civilizatório. Ponto.
Como se não bastasse a imposição constitucional e democrática de adoção dessa premissa por governos que se elegem com grande vantagem e com chapas “puras”, ela também vale, por óbvio, para governos que se elegem em coalizões amplas como foi a que elegeu Lula.
O presidente eleito chegou ao poder nas asas da maior e mais plural frente político-ideológica que já se viu neste país. Apoiado por adversários históricos, Lula não poderá — e não vai querer — fazer um governo “de esquerda” ou “do PT”, como ele mesmo cansou de anunciar na campanha.
Esse governo será uma lição de democracia para o bolsonarismo, mas não para Bolsonaro, já que ele se mostra obtuso demais para entender conceitos como democracia e república. Bolsonaro governou com pretensões de imperador e, assim, insurgiu-se contra a realidade que lhe foi imposta pelos pesos e contrapesos da democracia.
Lula não fará isso. Portanto, é ridículo que alguns grupos políticos mais à esquerda estejam querendo roer a corda porque a centro-direita fará parte da aliança para governar — e reconstruir — o Brasil.
Lula repetiu dezenas e dezenas de vezes, ao longo da campanha eleitoral, que seu governo será suprapartidário e supra ideológico. E isso ocorreu não só pelo inquebrantável espírito democrático do presidente, mas, também, porque a realidade obriga o novo governo do país a não adotar cara e filosofia partidárias e ideológicas.
O Congresso que o país terá a partir de 2023 terá um perfil ainda mais conservador que o atual. A direita passará a ocupar 50% das vagas da Câmara e 44% das cadeiras do Senado Federal. Ao todo, partidos de direita vão ocupar 259 das 513 cadeiras na Câmara dos Deputados, sete a mais que na composição atual. Já a esquerda, conquistou seis novas vagas e terá 25% da Câmara — mesmo percentual da centro-direita, que perdeu 13 parlamentares.
Se Lula fizer um governo com viés ideológico, ou seja, de esquerda, não conseguirá governar, já que terá apenas 1/4 dos deputados. Isso sem falar no Senado…
Em resumo, caso se confirme a adesão do União Brasil à coalizão governista, Lula terá apoio de cerca de 232 deputados e 31 senadores. Absolutamente insuficiente para governar. Ou seja, terá que ter muita habilidade para atrair apoio de parte da direita mais radical.
Espera-se ser desnecessário citar o que aconteceu com Dilma Rousseff por não ter apoio suficiente no Congresso… Portanto, a esquerda precisa refletir que é melhor um governo sem ideologia definida, mas presidido por um estadista, que roer a corda e facilitar a volta do inominável — ou algo até pior.
A sorte do Brasil é que a esquerda amadureceu bastante após tudo que aconteceu neste país após 2013. Assim, salvo grupos minoritários e pouco representativos, a maioria progressista entende os limites do terceiro governo de Luiz Inácio Lula da Silva.
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