Rede Médica pelo Direito de Decidir repudia interrupção de aborto legal em hospital e maternidade-escola na cidade de São Paulo

Nota de repúdio pelo fechamento intempestivo do Serviço de Atenção à Mulheres e Meninas vítimas de violência sexual e de interrupção da gravidez prevista em lei do Hospital Municipal e Maternidade Escola de Vila Nova de Cachoeirinha, referência no atendimento às meninas, mulheres e pessoas que gestam na cidade de São Paulo

Rede Médica pelo Direito de Decidir, 21 de dezembro de 2023

É com profunda preocupação e indignação que a Rede Médica pelo Direito de Decidir – Global Doctors for Choice/Brasil recebeu a notícia de que a Secretaria Municipal da Saúde de Paulo (SMS/SP) suspendeu o serviço de atenção à vítimas de violência sexual e aborto legal no Hospital Municipal Maternidade Escola de Vila Nova de Cachoeirinha, região norte da cidade.

O serviço é destinado às meninas e mulheres que tenham sido engravidadas em estupros, ou seja, vítimas de violência sexual, que estejam em gravidez que coloque sua vida em risco, e ainda, as que tenham uma gestação de feto anencéfalo, os três casos de interrupção da gravidez previstos em lei desde 1940 e por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF).

Nestas circunstâncias as meninas, mulheres e pessoas que podem gestar devem ter o direito garantido pelo Estado ao atendimento multidisciplinar, gratuito, humanizado e seguro por meio SUS (Sistema Único de Saúde).

Assim, com o fechamento do serviço na Maternidade Escola de Vila Nova Cachoeirinha, serão elas as mais profundamente impactadas.

Aliás, a Unidade Hospitalar é referência nacional também nos casos de anencefalia e má formação sem expectativa de vida extrauterina e a única com o serviço que não impunha limite de tempo gestacional para o aborto, barreira frequentemente enfrentada pelas meninas e mulheres que necessitam realizar a interrupção da gravidez.

Em notas anteriores, a Rede Médica pelo Direito de Decidir já apontou o quanto o procedimento do aborto, mesmo nas idades gestacionais mais avançadas, é marcadamente mais seguro que o de um parto.

Segundo o órgão da Prefeitura de São Paulo, responsável por realizar a gestão das políticas de saúde na esfera municipal, o serviço foi interrompido “para que seja realizado no local cirurgias eletivas, mutirões cirúrgicos e outros procedimentos envolvendo a saúde da mulher”.

No entanto, a Secretaria Municipal de Saúde não informou quando o serviço será retomado.

A Defensoria Pública de São Paulo já solicitou esclarecimentos, Movimentos Sociais e Organizações da Sociedade Civil em prol dos direitos sexuais e reprodutivos e contra todo tipo de violências de gênero seguem se manifestando pela previsível desassistência às vítimas de estupro da cidade de São Paulo, inclusive há uma petição pública para apoiar a reabertura imediata do serviço que é referência nacional, recebendo inclusive casos de outras regiões do Estado e do País.

Reiteramos a extrema preocupação da medida feita pela Secretaria Municipal de Saúde da cidade de São Paulo ao suspender o serviço, justificando a necessidade de oferta de outros procedimentos, também importantes para a promoção da saúde.

Assim, nos unimos aos que pedem a imediata reabertura do serviço de Atenção à vítimas de violência sexual e aborto legal às meninas e mulheres do Hospital Municipal e Maternidade Escola de Vila Nova de Cachoeirinha, em São Paulo, e enaltecemos a dedicação da equipe multidisciplinar da Maternidade Escola que há anos cumprem seu dever ético e profissional em prestar atenção de alta qualidade e servir de referência nacional na garantia dos Direitos Sexuais e Reprodutivos das mulheres e meninas brasileiras.

A dimensão da formação de médicas e médicos tem papel fundamental nestes cenários de tentativa de desmonte de serviços essenciais que garantem direitos, justamente por isso, ressaltamos a relevância da Maternidade Escola na formação de profissionais de saúde especialistas em ginecologia e obstetrícia e de residência multiprofissional, por meio da qualificação no atendimento à mulher em toda sua complexidade e dimensão.

Neste processo, outra aliada imprescindível é a Febrasgo (Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia) por meio das orientações nas ‘Diretrizes para o atendimento em violência sexual‘, segundo o qual os Programas de Residência Médica em Ginecologia e Obstetrícia devem oferecer oportunidades de aprendizagem teórica e prática aos estudantes, para que eles possam desenvolver competências profissionais relacionadas à atenção integral a pessoas em situação de violência sexual e aborto previsto em lei, sendo esta uma obrigação incluída no currículo das residências médicas pela Comissão Nacional de Residência Médica.

Por fim, nós, médicas e médicos da Rede Médica pelo Direito de Decidir – Global Doctors for Choice/Brasil, reforçamos o compromisso na defesa pela justiça reprodutiva, da ampliação, humanização e pela garantia integral de acesso a saúde sexual e reprodutiva a toda população, especialmente às meninas, mulheres e pessoas que podem gestar pobres e periféricas, justamente o público majoritário no Hospital Municipal e Maternidade da Vila Nova de Cachoeirinha.

Referências

1) Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 – artigos 5?, incisos III e IX

2) Nota da Rede Médica pelo Direito de Decidir – Global Doctors for Choice/ Brasil: Cinco lições que o Brasil deve aprender com o caso da menina de apenas 10 anos do Espírito Santo – 18/08/2020

3) Febrasgo – Nota informativa aos tocoginecologistas brasileiros sobre o aborto legal na gestação decorrente de estupro de vulnerável. 22 Junho 2022. https://www.febrasgo.org.br/pt/noticias/item/1470-nota-informativa-aos-tocoginecologistas-brasileir os-sobre-o-aborto-legal-na-gestacao-decorrente-de-estupro-de-vulneravel

4) Diretrizes para o atendimento em violência sexual: o papel da formação médica: o papel da formação médica. FEBRASGO POSITION STATEMENT. Número 4 – Abril 202 https://www.febrasgo.org.br/images/pec/anticoncepcao/FPS—N4—Abril-2021—portugues.pdf

5) Petição pública pela reabertura imediata do Serviço de Aborto Legal do Hospital e Maternidade Vila Nova Cachoeirinha destinado à Secretária Municipal de Saúde de São Paulo e ao Prefeito Ricardo Nunes elaborada por Rebeca Mendes, diretora executiva e fundadora do Projeto Vivas. https://peticaopublica.com.br/pview.aspx?pi=BR136877

6) Matéria “Prefeitura de SP suspende realização de aborto legal em hospital de referência”, por Mônica Bergano – publicada na Folha de S. Paulo em 20/12/2023.

Publicação de: Viomundo

Lunes Senes

Colaborador Convidado

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