Pedro Augusto Pinho: Guerra, modo de viver no mundo capitalista financeiro
Por Pedro Augusto Pinho*
O que é a paz? Norberto Bobbio, em seu “Dicionário de Política”, afirma que este conceito “não pode ser definido senão em relação e em estreita ligação com a definição de guerra”, conceito que encontra definições não relacionadas a outros verbetes, mas a tecnicalidades científicas: guerra na ciência jurídica, na sociologia, na ciência política, até nas ciências naturais.
Poderíamos concluir que o estado bélico, o mundo em guerra, é a situação normal, sendo a paz uma exceção, um descuido dos senhores da guerra.
Vejamos o mundo termonuclear, designação do sábio Darcy Ribeiro, que completaria 100 anos em 26 de outubro, para o mundo que domina a tecnologia nuclear.
Do fim da II Grande Guerra, 1946, até o domínio das finanças apátridas em grande parte do mundo, especialmente no mundo capitalista, em 1991, tivemos 28 guerras, excluídas escaramuças de fronteiras. Destas 14 tiveram a presença dos Estados Unidos da América (EUA).
Este número nem pode ser considerado excessivo, se pensarmos que inclui as guerras de libertação de asiáticos e africanos pelo fim do domínio europeu em seus países: Indochina, Laos, Angola, Moçambique, Guiné Bissau, Argélia etc.
Também computamos o prosseguimento de guerras coloniais, como as que Israel cometeu contra o povo palestino e árabes do entorno de seu Estado nacional, e como da Baía dos Porcos, onde os cubanos derrotaram os estadunidenses, e a Inglaterra agrediu a Argentina pelas Ilhas Malvinas, e os EUA cometeram contra a Coreia, o Vietnã, a República Dominicana, a Nicarágua, Honduras e vem fomentando desde 1964 na Colômbia, que classificam de “guerra contra as drogas”.
Porém, 1991, foi saudado como a nova era. O fim da história de lutas e conflitos pela vitória da democracia, da autorização do poder unipolar de espoliar impunemente a todos, a liberdade do capital financeiro agir por toda Terra como em seu quintal.
Triste e ledo engano. Em menos de uma década do triunfo do capital financeiro apátrida (1991-1999) tivemos seis guerras, todas com participação estadunidense, contra o Iraque (1ª Guerra do Golfo: 1990-1991), na Bósnia (1992-1995), na Chechênia (1994-2006), no Kosovo (1996-1999) e duas no Congo (1996 a 2003).
No século XXI, as guerras são permanentes, e todas com a participação estadunidense, ora envolvendo a Europa – ocupada pela ficção do Tratado do Atlântico Norte (NATO-OTAN) – ora com outros países de sua órbita de dominação.
Com a farsa do 11 de setembro, os afegãos sofreram a invasão estadunidenses. Com a farsa das armas de destruição em massa, os iraquianos tiveram seu país saqueado, seu petróleo transferido para empresas dos EUA, e objetos de sua rica e milenar cultura vendidos em leilões de Londres e Nova Iorque.
Para “libertar” a Líbia do governante que a transformou no país de maior IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) da África, que uniu no Estado Nacional tribos até então conflitantes e desprovidas de recursos, colocou-a sem petróleo, sem água e sem Estado Nacional, uma ficção de País. E com pretextos ridículos de governos ditatoriais invadiu, com falsas bandeiras, a Síria, a pérola do Oriente, país rico e de milenar cultura.
Embora o agente explícito seja um Estado, a força que move essas atrocidades é o capital financeiro apátrida que atua nos EUA com o domínio do que o ex-presidente estadunidense Dwight Eisenhower denominou “complexo industrial militar”, o verdadeiro “estado profundo” dos EUA.
A Ucrânia, que está na ordem do dia, foi invadida e tomada por forças nazistas, pela ação dos EUA, em 2014. As operações ou golpes coloridos para destituir governantes eleitos: a cor ucraniana foi laranja. E tem sido mantida em guerra permanente contra sua própria etnia, visto que todos têm origem eslava, o idioma russo é falado por cerca de um terço da população como língua materna, e os governos socialistas, que dominaram por largo período o poder nacional, transformaram a Ucrânia em verdadeiro celeiro, devido à fertilidade de suas terras. Em 2011, o país era o terceiro maior exportador de grãos do mundo.
Porém não é apenas o país do agronegócio; tem o setor de manufatura bem desenvolvido, especialmente na área da aeronáutica e de equipamentos industriais. Em 2019, o país era um dos 10 maiores produtores do mundo de minério de ferro, de manganês, titânio e urânio.
A Ucrânia é uma república unitária, com 24 províncias, com área de 603.628 km². Há, como é evidente, motivações diversificadas para as guerras. Porém há um combustível que as provoca desde o início do século passado e prosseguirá até o fim deste, com grande probabilidade: os fósseis, o petróleo.
A Europa é um continente desprovido de petróleo. Todas as reservas somadas, incluindo da Noruega, do Reino Unido, da Itália, são inferiores às do Brasil.
A diferença só não é maior porque o pré-sal está sendo entregue para interesses alienígenas e a cubagem dos volumes de óleo e de gás estão muito aquém das expectativas dos geólogos exploracionistas.
A Europa, em 31/12/2020, tinha reservas de 13,6 bilhões de barris de óleo, dos quais 7,9 bilhões da Noruega, e 3,2 trilhões de m³ de gás, sendo 1,4 trilhões também na Noruega.
A Comunidade de Estados Independentes (CEI), da qual a Federação Russa faz parte, na mesma data, tinha 146,2 bilhões de barris de óleo, e 56,6 trilhões de m³ de gás, para os quais a Federação Russa contribuía, respectivamente, com 107,8 bilhões de barris e 37,4 trilhões de m³.
Os EUA têm 68,8 bilhões de barris de óleo, onde estão incluídos os volumes dos folhelhos betuminosos (shale oil), e 12,6 trilhões de m³ de gás. Seu consumo em 2020 foi de 18 milhões de barris/dia de óleo e 832 bilhões de m³ de gás.
A Europa consumiu 13 milhões de barris/dia de óleo e 541,1 bilhões de m³ de gás. A Federação Russa, respectivamente, 3 milhões em óleo e 411,4 em gás.
Estes dados, retirados da “bp Statistical Review of World Energy”, 2021, demonstram uma parte das razões da guerra.
A Europa não sobreviverá a um inverno, mesmo não sendo dos mais rigorosos, sem o petróleo russo. Os EUA terão que retirar dos colonizados países do Oriente Médio e, ao preço muito maior para os europeus, tentar suprir suas necessidades.
Finalmente, como já foi divulgado pelo noticioso da Associação dos Engenheiros da Petrobrás – AEPT Direto, em 11/02/2022, a denominada energia verde está deixando a Europa sem energia (Os limites da energia verde estão se tornando muito mais claros, do estadunidense Gail Tverberg, um especialista em energia).
*Pedro Augusto Pinho, administrador aposentado.
Publicação de: Viomundo