Após tentativa violenta de despejo, integrantes de acampamento do Pará são recebidos pelo Incra
Quase duas mil famílias seguem acampadas há cerca de 20 dias no município de Parauapebas, sudeste do Pará, considerado um dos territórios mais violentos para trabalhadores do campo no país. O Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) aponta que a área é grilada e exige do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) a vistoria das terras e cadastramento das famílias para fins de reforma agrária.
A ocupação aconteceu no último dia 20. As famílias que integram a ação apontam que as fazendas Santa Maria e Três Marias são latifúndios improdutivos frutos de grilagem por parte da Família Miranda, conhecida por seu extenso patrimônio de terras na região e envolvimento em conflitos agrários.
“No último dia 20, mais de 2 mil famílias ocuparam um latifúndio em protesto, questionando o fato de o imóvel pertencer à família Miranda, que há 50 anos coloniza o Pará e a Amazônia, com histórico de envolvimento em conflitos agrários, em repressão aos trabalhadores e submetendo trabalhadores a situações precárias”, explica Pablo Neri, que compõe a direção nacional do MST.
Ainda no dia de ocupação, as famílias foram surpreendidas por uma tentativa de despejo. A ação aconteceu sem mandado judicial e com o cerco de mais de 30 caminhonetes de fazendeiros da região, apontados como membros do movimento “Invasão Zero”.
Desde então, as famílias seguem acampadas próximas da localidade, no Assentamento Palmares 2.
“O ato de ocupação do último dia 20 teve como consequência uma reunião com o Incra, da regional de Marabá. Os trabalhadores protocolaram sua pauta e agora aguardam que no próximo dia 10, o Incra inicie o processo de cadastro das mais de mil famílias que seguem acampadas em Parauapebas, no Acampamento Terra e Liberdade”, complementa Neri.
Após a reunião em Marabá, representantes das famílias seguem o diálogo em defesa do avanço da reforma agrária e foram recebidas também pelo presidente do Incra, César Aldrighi, em Brasília (DF), a quem solicitaram agilidade na resolução das demandas.
“E agora o Acampamento Terra e Liberdade tem como pauta a vistoria imediata dos imóveis da família Miranda, o cadastramento das famílias para que sejam alvo da política de reforma agraria do governo Lula e tem como pauta a transformação social, a partir da reforma agrária, como um ato por busca por justiça social”.
O advogado popular e membro da Comissão Pastoral da Terra (CPT), José Batista Gonçalves, acompanha a situação do Acampamento Terra e Liberdade e destaca as históricas violações de direitos no campo no estado do Pará.
“As regiões sul e sudeste do Pará são muito conhecidas pelas graves violações dos direitos humanos no campo. De acordo com monitoramento feito pela Pastoral da Terra, são regiões onde se concentram o maior número de assassinatos no campo, chacinas, massacres, casos de trabalho escravo e assassinato de camponeses”, explica Batista.
Dados publicados no mês de outubro pela CPT apontam, inclusive, que a região Amazônica se tornou o “epicentro da violência” e o estado do Pará é o segundo mais violento do país, como denuncia Batista.
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“As causas geradoras dessa violência estão associadas ao modelo de desenvolvimento imposto para essa região, principalmente a partir do golpe militar de 64, onde se priorizou a expansão da pecuária extensiva, a exploração ilegal da madeira e a exploração mineraria”, explica.
As famílias seguem em articulação no acampamento por meio de encontros de formação e organização. A CPT reforça ainda o papel do MST na região, apontando a reforma agrária enquanto saída para a garantia de vida digna às famílias no campo.
“Uma das alternativas para essas famílias é se organizarem e fazerem a luta pelo acesso à terra, e em função disso, a cada ano ocorrem inúmeras ocupações rurais e urbanas, e o MST tem tido uma tarefa importantíssima de acolher e organizar essas famílias, no sentido de exigir do Incra que faça a reforma agrária e distribua a terra para que essas famílias possam morar e produzir”, conclui Batista.
Em nota, a Família Miranda afirma que a área pertence ao complexo de fazendas do grupo, que é totalmente legalizada e possui número de matrícula. O Incra se comprometeu a realizar a vistoria das áreas, a fim de apurar possíveis irregularidades apontadas pelo MST, além do cadastramento das famílias que seguem acampadas, para que sejam incluídas no programa de reforma agrária nacional.
Publicação de: Brasil de Fato – Blog