Ângela Carrato: Até no dia da mentira JN usa fake news clássica para combater outras fake news
MENTIRA, ATÉ NO DIA DA MENTIRA
Por Ângela Carrato*, em seu perfil em rede social
Quase no final da edição de ontem (1/4), o Jornal Nacional, através de seu principal âncora, William Bonner, fez uma espécie de editorial exaltando a importância do “jornalismo profissional”, do compromisso com o fato e da necessidade de se combater as fakes news.
O objetivo era apresentar para o “respeitável público” um vídeo que, segundo Bonner, vai ser exibido durante toda a campanha eleitoral na Globo.
Até aí, tudo certo, se para o JN os fatos não fossem apenas o que ele e demais veículos da mídia corporativa apresentam como tal e não computassem as fake news na conta das redes sociais e da mídia independente.
Como mentira tem perna curta, a reportagem que se seguiu a este editorial foi uma clássica fake news.
A exemplo do que faz há seis anos, o JN abriu generoso espaço para Sergio Moro dar o seu recado, sem qualquer contextualização sobre sua história e trajetória e, pior ainda, sem qualquer questionamento à sua fala.
E o que disse Moro? Disse que não desistiu de ser candidato à presidência da República e que não está atrás de foro privilegiado.
O ex-juiz parcial falou, falou, mas não convenceu.
Se, como enfatizou, prezava tanto a magistratura ou o cargo de ministro da Justiça, por que abriu mão dos dois?
Por que prendeu, sem provas, o ex-presidente Lula?
Já está provado que foi para tirar Lula do páreo em 2018 e abrir espaço para a vitória de Bolsonaro, mas não ocorreu a Bonner lembrar esse fato.
Muito menos ocorreu a Bonner lembrar que o STF considerou Moro um juiz parcial, o que equivale à maior desmoralização possível para um magistrado.
Como se isso não bastasse, Moro ainda aceitou como prêmio pelos serviços prestados, o cargo de ministro da Justiça no governo Bolsonaro.
Igualmente não ocorreu a Bonner recordar a lamentável passagem de Moro pelo governo Bolsonaro.
Aliás, até hoje o JN esconde do seu “respeitável público” toda a trama denunciada e comprovada pela #VazaJato, série de reportagens publicadas pelo The Intercept BR, a partir de vazamentos do hacker Walter Delgatti.
Nessas reportagens, o submundo da Operação Lava-jato veio à tona. Ficou patente, por exemplo, a ligação dela com órgãos de segurança/espionagem e interesses dos Estados Unidos ao arrepio da lei, as tramóias para tentar criminalizar Lula e o voraz apetite por dinheiro de então procurador federal Deltan Dallagnol e turma.
Se as instituições estivessem efetivamente funcionando, era para Moro e Dallagnol estarem respondendo a pesados processos e dificilmente escapariam de condenações.
Talvez seja exatamente por isso que Moro e Dallagnol estejam atrás de foro privilegiado.
Ambos temem o futuro. Mas, claro, Bonner se esqueceu de tudo isso.
Descontando-se o lero-lero de Bonner, esta edição do JN deixou claro três coisas:
1. A família Marinho não desistiu de Moro e tudo fará em apoio ao seu “queridinho”;
2. Os golpistas (e seus aliados externos) seguem com dois candidatos: Bolsonaro e Moro;
3. O papel de Moro pode ser inclusive o de funcionar como linha auxiliar de Bolsonaro para evitar uma possível vitória de Lula no primeiro turno.
No mais, num único aspecto ninguém pode negar que Bonner foi verdadeiro.
O JN não se comprometeu com a verdade nem no dia da mentira.
*Ângela Carrato, jornalista, professora da UFMG e apoiadora da chapa ABI Luta Pela Democracia.
Publicação de: Viomundo