Venezuela: pés fincados no território e coletivização do poder

No último domingo (27), milhares de venezuelanos e venezuelanas foram às urnas para as eleições municipais, elegendo prefeitos e vereadores em todo o território nacional. Junto à escolha para os novos representantes legislativos e executivos, a juventude foi convocada para participar da 1ª Consulta Pública Nacional

Nós estivemos pela primeira vez no país, na condição de vereadores de nossas cidades – Aracaju e Rio de Janeiro –, convidados na condição de observadores internacionais, para conhecer a experiência e promover um intercâmbio político e cultural com um conjunto de vereadores de outros países, além de movimentos sociais. O que nos une é a concepção do processo de participação popular neste país latino-americano e a percepção da possibilidade de potencialização dos municípios como peças fundamentais para a construção de um projeto nacional. Um projeto que tenha os pés fincados no território e a concepção de democracia como um mecanismo que vai além das urnas: está na construção cotidiana da coletivização do poder.

Segundo dados divulgados pelo Conselho Nacional Eleitoral da Venezuela (CNE), 44% de eleitores ativos participaram da eleição, num país em que o voto não é obrigatório. As forças chavistas elegeram 304 entre as 335 prefeituras disputadas, com especial atenção para a reeleição da prefeita de Caracas, Carmen Meléndez, com 86,11% dos votos. Enquanto isso, as forças de oposição, fragmentadas no pleito, venceram em 31 municípios. O partido Fuerza Vecinal, fundado em 2021, concentrou vitórias eleitorais em regiões metropolitanas mais abastadas da Grande Caracas, como Chacao e Baruta. 

No município de Carrizal, a candidatura da jovem Jennifer Mujica (Movimiento Futuro/Gran Polo Patriótico) nos chamou a atenção ao percebermos a potencialidade e investimento político destinado à formação de novas lideranças que sigam reivindicando o legado chavista. Ela foi eleita por 32,46% dos eleitores, com 6.233 votos. Sob o slogan “Carrizal merece más“, o discurso de Jennifer em seu comício final, do qual participamos entre salsas e batucadas, foi todo baseado no fortalecimento do poder popular e na participação política do povo, além de agitar bandeiras do humanismo, da esperança, da solidariedade e do internacionalismo. 

A candidatura de Jennifer não nos parece um caso isolado no que se refere à participação política da juventude. A Consulta Popular Nacional, com o objetivo de escutar todos os jovens a partir dos 15 anos sobre a prioridade de aplicação em projetos infraestruturais destinados às comunidades, expressa um esforço do governo em manter a atração da juventude para a participação ativa na política nacional. Foram 5.336 projetos aprovados, elaborados pelos próprios Conselhos Comunais, sendo um instrumento que se assemelha às Missões Bolivarianas ou até mesmo ao orçamento participativo, e que foram elaborados pelos próprios Conselhos Comunais. Os projetos significam uma verdadeira explosão de construções e desenvolvimento econômico, na medida em que levarão recursos a serem executados pelas comunas. 

Saímos deste processo ainda mais convencidos da importância dos municípios para a construção de projetos nacionais, que perpassam necessariamente pela participação popular na escolha dos rumos de um país. A experiência venezuelana vem nos mostrando que a democracia e o ensejo político residem no processo de conscientização permanente, em que a população participe efetivamente do poder e das tomadas de decisões. Ou seja, a construção de um Estado Nacional pode e deve ser concebida desde os territórios, dos comuns, que são múltiplos e plurais, tal como o papel das Comunas e dos Conselhos Comunais na organização do Estado venezuelano. 

Em tempos de defesa da soberania nacional e da ofensiva imperialista de Trump ao Brasil e aos países do Sul Global, urge a necessidade de unirmos forças para proteger nossos territórios, afirmando que as escolhas políticas, econômicas e sociais de um país cabem apenas ao seu povo. Este é um desafio histórico para o nosso país e por isso é necessário romper com os muros que dividem os poderes institucionais e a população. 

Acreditamos que iniciativas feitas pelos e para os territórios devem ser potencializadas. Instrumentos como o orçamento participativo, ferramentas de solidariedade ativa como o projeto Mãos Solidárias, organização cultural nos territórios – como as rodas de rima e rap – e o Plebiscito Popular pela taxação dos super-ricos e pelo fim da escala 6×1 são fundamentais para a democratização do poder. Estas são algumas iniciativas que podem contribuir para avançarmos em uma disputa de consciências sobre qual democracia queremos: que não termina e nem começa nas eleições, mas que consiste na participação popular em todas as esferas de poder. 

Internacionalizemos a luta, internacionalizemos a esperança! 

*Camilo Daniel, militante do MST, é vereador de Aracaju e presidente eleito do PT de Aracaju.

**Maíra do MST é vereadora pelo PT no Rio de Janeiro e doutoranda em história na UERJ.

**Este é um artigo de opinião e não necessariamente representa a linha editorial do Brasil do Fato.

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Publicação de: Brasil de Fato – Blog

Lunes Senes

Colaborador Convidado

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