Haddad precisará “seduzir” o “mercado”
Foto: TON MOLINA/FOTOARENA/ESTADÃO CONTEÚDO
Anunciado pelo presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva como ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT) terá como um de seus desafios conquistar a confiança do mercado e estabelecer uma comunicação de qualidade com agentes econômicos. Na avaliação do cientista político Carlos Melo, Haddad é um nome de extrema confiança de Lula, leal ao presidente eleito e foi escolhido por defender a conciliação entre responsabilidade fiscal e desenvolvimento econômico. No entanto, o petista é visto com reserva por investidores e deve enfrentar resistência.
“Haddad terá o desafio de esmerar a capacidade de comunicação com agentes econômicos”, analisa Melo. “Ele terá que fazer esforço para conquistar credibilidade. O mercado vai testá-lo a toda hora”, diz. “Os melhores ministros da Fazenda foram aqueles que sabiam negociar com o mercado, como [Pedro] Malan, Antonio [Palocci] e [Henrique] Meirelles. Haddad terá que aprender.”
Consultor e professor do Insper, Melo avalia que a escolha para o Ministério da Fazenda de um político como Haddad e não de alguém ligado ao mercado é “uma aposta de risco” para Lula.
O futuro ministro da Fazenda comandou o Ministério da Educação entre 2005 e 2012, foi prefeito de São Paulo entre 2013-2016 e concorreu à Presidência no lugar de Lula em 2018. Nestas eleições, foi derrotado na disputa pelo governo paulista por Tarcísio de Freitas (Republicanos).
Antes da carreira pública, Haddad foi analista de investimentos do Unibanco e consultor da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe). O petista ingressou na administração pública como subsecretário municipal de Finanças de São Paulo entre 2001 e 2003, na gestão Marta Suplicy, atuando com o secretário João Sayad. Depois, foi assessor especial do Ministério do Planejamento, então comandado por Guido Mantega, e estruturou a lei das Parcerias Público-Privadas (PPPs).
A gestão de Haddad na prefeitura foi marcada pela responsabilidade fiscal, lembra Melo, com a renegociação da dívida da cidade com a União. O petista articulou um movimento para trocar o indexador da dívida de Estados e municípios com a União. Com o acordo, a dívida da capital caiu de R$ 74 bilhões para R$ 27,5 bilhões. Haddad conseguiu ainda para a cidade um inédito grau de investimento da agência de risco Fitch Ratings. O governo foi marcado também pelo aumento de imposto, com o reajustar do IPTU e a elevação da alíquota do imposto sobre transmissão de imóveis, o ITBI.
Melo analisa que mesmo com a gestão fiscal responsável em São Paulo, Haddad é visto com desconfiança pelo mercado. “Se o ministro fosse um banqueiro, talvez o mercado tivesse mais boa vontade com Lula. Mas o governo eleito não quer alguém do mercado, porque quer equilibrar política fiscal e política de desenvolvimento”, afirma.
Uma das justificativas de agentes econômicos é o temor de que o governo “Lula III” adote uma política econômica semelhante à da ex-presidente Dilma Rousseff. “É um ‘efeito rebote’ por conta da Dilma. O país enfrentou uma recessão em 2015 e 2016 por erros na condução da política econômica”, diz o professor. “Há um temor de que o ‘Lula III’ seja mais parecido com Dilma do que com Lula I e Lula II.”
A montagem da equipe econômica por Haddad, com nomes mais palatáveis aos investidores, pode azeitar a relação com o mercado. A apresentação da regra fiscal que deve substituir o teto de gastos também pode ajudar no diálogo.
Melo reforça, no entanto, a importância da comunicação para Haddad. “Ele terá de dar sinais concretos do que pretende fazer e construir uma relação com o mercado, ganhar confiança.”
Apesar de Haddad ser visto como um possível sucessor de Lula em 2026, Melo pondera que a Fazenda não é a melhor Pasta para ter visibilidade política. “É um cargo que cria mais vilões do que heróis”, diz. A projeção obtida por Fernando Henrique Cardoso na Pasta, no governo Itamar Franco, que o ajudou a vencer a disputa presidencial em 1994, se deve a uma circunstância política específica, que não deve se repetir agora.
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