Beto Almeida: UnB, uma universidade e um movimento estudantil contra a pedagogia colonial
Da Redação
Pela quarta vez a Universidade de Brasília (UnB) sedia a reunião anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), que termina neste sábado.
Na segunda-feira, foi lançado no anfiteatro 9 do Minhocão, palco de históricas assembleias, o livro “UnB Anos 70 — Memória do Movimento Estudantil”, da editora Alameda.
Uma publicação histórica que retrata as lutas e as paixões de uma geração engajada na transformação do Brasil.
Com fotos da época — a maioria do Correio Braziliense —, o livro traz depoimentos de estudantes que participaram dos movimentos estudantis da época.
O jornalista Beto Almeida é um deles.
Ex-líder estudantil, Beto foi expulso da UnB em 1977.
Abaixo, a íntegra do discurso que preparou para o lançamento do livro “UnB Anos 70” e acabou não sendo lido.
Uma Universidade e um Movimento Estudantil contra a Pedagogia Colonial
Por Beto Almeida *
Quis a conspiração do Deus do Tempo, Kronos, que este ato se realizasse num 26 de julho, data que marca a virada nos destinos históricos para América Latina, por ser o início da primeira Revolução Socialista vitoriosa na região, a Revolução Cubana.
Aqui, nesta Universidade Necessária de Darcy Ribeiro, erguida com suor, sangue e lágrimas dos Candangos, o governo Jango criou esta alavanca para questionar e enfrentar a Pedagogia Colonial que sempre marcou a universidade no Brasil.
A UnB nasce quando o Brasil estava sonhando com as Reformas de Base, quando havia a Campanha Nacional de Alfabetização, dirigida por Paulo Freire, Anísio Teixeira e o próprio Darcy. Os primeiros estudantes da UnB também eram alfabetizadores de candangos!
A UnB nasceu como ferramenta para pagar as gigantescas dívidas sociais do Brasil. E que ainda hoje não foram pagas.
O analfabetismo ainda machuca o Brasil, mas já foi erradicado em Cuba, na Venezuela, Nicarágua e Bolívia. Milhões de brasileiros ainda bebem água podre, como os animais.
Aqui, aprendi a pensar conscientemente, aqui escutei, pela primeira vez, Mercedes Sosa cantando a pura rebeldia de “Me gustan los Estudiantes”, da lavra poética revolucionária de Violeta Parra. Aqui germinaram meus dois talismãs de uma vida inteira: Mariana, com Carime, que estudava História, e Aurora, com Tereza, da Educação Física.
O Movimento Estudantil da UnB sempre foi celeiro de quadros para questionar e mudar o Brasil e o mundo. Do movimento estudantil também surgiram Fidel Castro, Daniel Ortega.
Mesmo nos períodos mais autoritários, o ME da UnB sempre buscou sintonia com o sonho rebelde da Universidade Necessária de Darcy.
A expulsão não arrancou a UnB dos nossos corações. Ao contrário, a enraizou mais profundamente. Há 45 anos andamos de mãos dadas com a UnB.
Aqui realizamos greves corajosas para pedir democracia, eleição direta, reformar agrária, nacionalização do que pertence ao povo brasileiro, como a Petrobrás, Eletrobrás, Telebrás, Vale, que precisam voltar à soberania do Brasil.
Aqui fizemos a campanha UM LÁPIS PARA A NICARAGUA, e a comunidade UnB foi generosa na doação de milhares de lápis para a Revolução Sandinista, mesmo quando uma usina de ódio estava instalada naquilo que se chamava Reitoria, mas era a prepotente intervenção ditatorial, a quem acusamos pelo desaparecimento de Honestino Guimarães.
45 anos depois daquela Greve de 1977, que abalou o país e espantou o medo, aqui voltamos para reafirmar nosso compromisso com os Candangos que construíram a UnB, Brasília e o Brasil.
Aqui voltamos para sonhar Darcy Ribeiro e renovar nosso compromisso com a Universidade, que deve não apenas ser pública e gratuita, mas também uma fortaleza de luta contra a Pedagogia Colonial que está no MEC, nos Meios de Comunicação, no Congresso e na Politica Econômica que rapina 50 por cento do Orçamento Federal, para engordar banqueiros por meio do diabólico sistema da dívida.
Aqui viemos para dizer, 45 anos depois, que mantemos acesa a chama do Movimento Estudantil transformador e da Universidade Necessária!
*Beto Almeida, jornalista, ex-líder estudantil.
Em Memória de Carlos de Lucena Aiube (Matemática) e de Mario Casto (Arquitetura).
Publicação de: Viomundo