Jair de Souza: A justíssima punição da organização criminosa e a alegria popular
A punição da organização criminosa e o regozijo popular
Por Jair de Souza*
É impossível negar que fomos tomados por um sentimento de grande alegria ao receber o veredito judicial com a condenação de todos os integrantes do primeiro escalão da organização criminosa capitaneada por Jair Bolsonaro, em razão dos vários crimes praticados em sua tentativa de levar adiante um golpe de Estado.
Porém, a vingança não é a motivação que nos impele a lutar. O que nos impulsiona é a esperança e o desejo de transformar o mundo para que nele imperem a justiça, a dignidade e a solidariedade. É por isso que não nos alegramos com a condenação jurídica que acaba de ser aplicada pela Primeira Turma do STF aos articuladores das ações golpistas.
É plenamente compreensível que tenha havido uma efusiva demonstração de satisfação com o veredito da Corte Máxima condenando os líderes da quadrilha a penas de longos anos de prisão.
Mas, apesar de ser compreensível, caso essa atitude tenha se ancorado em sentimento de ódio pessoal, a mesma não terá sido aceitável. Pelo menos para os que cultuam o sonho maior de transformar o mundo para que nele prevaleçam a justiça, a dignidade e a solidariedade entre todos.
Como não somos punitivistas, nosso propósito não é, e nunca deve ser, o de castigar ninguém. Nosso enfrentamento com as classes dominantes exploradoras não tem por objetivo impor sofrimentos pessoais a nenhum de seus membros ou prepostos.
A verdadeira punição que os sanguessugas de nosso povo merecem e deveriam receber é a eliminação das condições sociais que lhes possibilitam usufruir de tantos privilégios às custas do sacrifício do conjunto da população.
Portanto, é com a destruição das bases que dão sustentação a sua hegemonia na sociedade que esses grupos vão ser de fato severamente punidos.
É certo que queríamos e exigíamos a rigorosa aplicação da lei a todos os réus comprovadamente envolvidos no plano criminoso, mas não estamos agora nos regozijando pela punição em si. Pedíamos e cobrávamos uma atitude firme do STF, por ser isto uma medida indispensável para que o caminho que nos conduz à materialização de nosso sonho maior não volte a ser obstruído.
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A impunidade dos delinquentes neste caso serviria como forte alento para que estes e outros prepostos das classes dominantes se sentissem encorajados a repetir a tentativa na primeira oportunidade que venha a surgir.
Nossos embates têm por meta atingir os setores dominantes como classe, e não como indivíduos. Então, os castigos que aspiramos aplicar-lhes estão relacionados com a perda de seus privilégios, com vistas à edificação de uma sociedade muito mais igualitária. Não esperamos, nem desejamos que os integrantes dessas classes, nem seus filhos, passem pelas privações e carências que, em nosso país, eles sempre impuseram a milhões de trabalhadores e seus filhos.
Neste sentido, almejamos que as riquezas e a abundância existentes sirvam para saciar as necessidades básicas de todos, sem transferir as privações para os atuais privilegiados. Nenhum dos grandes bilionários, ou seus familiares, vai precisar passar fome para que todos possam comer dignamente. Só não podemos tolerar que a absurda opulência do pequeno grupo detentor de grandes fortunas se imponha, em detrimento dos direitos elementares de toda nossa gente.
Por conseguinte, nosso júbilo com a condenação dos líderes golpistas fará sentido se servir para possibilitar que as forças do campo popular tenham mais condições de avançar no processo de lutas visando alcançar nossa verdadeira meta. É este fator o que deve justificar nosso contentamento, não a punição dos agentes golpistas.
Afinal, os sentenciados não são nada mais que meros serviçais daqueles que realmente detêm a riqueza e o poder em nosso país. Se nossa euforia não resultar em transformações nas estruturas de dominação prevalecentes, ela terá sido inútil.
Então, vamos aproveitar o momento da condenação da quadrilha bolsonarista para conscientizar a todos de que é justo e imperativo obrigar os mais ricos a pagarem impostos em proporção a seus rendimentos, tendo sempre em conta a máxima de que “quem mais ganha mais deve pagar”.
Precisamos travar a luta ideológica para impedir que pessoas do campo popular, em lugar de aderirem à luta para exigir a taxação dos super-ricos e das operações financeiras, engrossem o campo dos que cobram o fim do Bolsa Família e de outros modestos programas sociais que procuram amenizar as terríveis carências dos mais necessitados. Todo nosso povo deve ser encorajado a gritar em alto e bom tom: Bolsa Família, sim, Bolsa Banqueiro, não!
Ainda com relação a isto, não podemos admitir que pastores e igrejas totalmente alinhados com as classes dominantes, sua perversidade, sua injustiça e seu servilismo ao imperialismo estadunidense, continuem gozando de tantos privilégios de isenções fiscais, inclusive em suas atividades nitidamente de cunho comercial.
Por que a totalidade do povo brasileiro deveria arcar com os enormes custos para a manutenção das estruturas do Estado, enquanto certos pastores e igrejas odiadores de Jesus continuam acumulando gigantescas fortunas pessoais, que lhes possibilitam, inclusive, financiar as atividades políticas do bolsonarismo?
Assim, nosso regozijo, neste momento em que se confirma a justíssima punição jurídica dos membros do alto escalão da organização criminosa do bolsonarismo, só pode ser justificado se estiver fundamentado em nossa convicção de que isto representa apenas um detalhe no processo de nossa luta principal para a edificação daquilo que realmente nos motiva: a construção de um mundo onde a justiça e a solidariedade tenham mais peso do que a ganância individualista.
*Jair de Souza é economista formado pela UFRJ; mestre em linguística também pela UFRJ.
Este artigo não representa obrigatoriamente a opinião do Viomundo.
Publicação de: Viomundo