Vacinação infantil começou no Brasil entre erros e desencontros do governo Bolsonaro
O início da vacinação infantil contra a covid-19, na última sexta-feira (14), está marcado por desencontros e erros do governo federal.
No total, são necessárias 40 milhões de doses para imunizar todas as crianças no país. Mas até o momento, há 30 milhões de doses previstas para o primeiro trimestre do ano.
Mudanças no transporte das doses
De última hora, o Ministério da Saúde tentou modificar o padrão de entrega das doses aos estados. A mudança, disse a pasta em nota à Folha de S. Paulo, “acarretou um desencontro” entre os entes federativos.
Até então, as empresas contratadas pelo transporte das vacinas eram responsáveis pela logística das doses até os centros de armazenamento das capitais. Desta vez, no entanto, o Ministério informou que a função caberia às secretarias de Saúde.
Contratação de empresa sem experiência
Ainda de acordo com o jornal, a empresa, contratada em dezembro com dispensa de licitação para realizar o transporte e armazenagem das doses, não tem experiência na área.
A Intermodal Brasil Logística (IBL) trabalhou apenas uma vez com imunizantes e não foi com o Sistema Único de Saúde (SUS). Como resultado, houve relatos de atraso na entrega de doses e de condições inadequadas de transporte e armazenagem.
Prescrição médica em consulta pública
Após a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) autorizar a vacinação de crianças entre cinco e 11 anos, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, disse que não haveria emergência em imunizar esse público e anunciou uma consulta pública para tomar a decisão.
Até então a realização de consultas públicas nunca havia sido colocada como uma etapa do processo de aprovação dos imunizantes, o que atrasou o início da campanha infantil.
“Os óbitos de crianças estão dentro de um patamar que não implica em decisões emergenciais. Ou seja, isso aqui favorece o ministério tomar uma decisão baseada em evidência científica de qualidade, na questão da segurança, na questão da eficácia e da efetividade”, afirmou o ministro em dezembro de 2021.
A consulta pública buscava saber, entre outros pontos, se a sociedade brasileira era a favor ou não da obrigatoriedade de prescrição médica para a imunização de crianças.
Em 4 de janeiro, finalizada a consulta, o governo anunciou que a maioria daqueles que responderam à consulta são contra a necessidade de apresentação de prescrição médica para vacinação.
“Tivemos 99.309 pessoas que participaram neste curto intervalo de tempo em que o documento esteve para consulta pública. A maioria foi contrária à obrigatoriedade da prescrição médica no ato de vacinação”, anunciou a secretária extraordinária de Enfrentamento à Covid-19 do Ministério da Saúde, Rosane Leite de Melo.
Posicionamento contrário à vacinação infantil
Mesmo com a aprovação da Anvisa e a realização da consulta pública, o presidente Jair Bolsonaro (PL) voltou a criticar a vacinação em crianças, após a divulgação do cronograma de imunização.
Em entrevista à TV Nova Nordeste, de Pernambuco, Bolsonaro anunciou que não irá levar a filha de 11 anos para se vacinar. O capitão reformado ainda acusou os técnicos da Anvisa de terem algum tipo de interesse na liberação do imunizante.
“A Anvisa lamentavelmente aprovou a vacina para crianças entre 5 e 11 anos. A minha opinião eu quero dar para você aqui. A minha filha de 11 anos não será vacinada”, disse Bolsonaro.
“E você vai vacinar seu filho contra algo que o jovem por si só, uma vez pegando o vírus, a possibilidade de ele morrer é quase zero? O que é que está por trás disso? Qual é o interesse da Anvisa por trás disso aí? Qual é o interesse daquelas pessoas ‘taradas por vacina’? É pela sua vida? É pela sua saúde? Se fosse, estariam preocupados com outras doenças do Brasil, que não estão”, afirmou o presidente.
No mesmo dia em que a Anvisa aprovou a vacinação infantil, em 16 de dezembro, o presidente declarou que havia solicitado “extraoficialmente” a lista dos diretores que aprovaram o imunizante para que “todo mundo tome conhecimento quem são essas pessoas e obviamente forme seu juízo”.
Em nota, o Conselho Nacional de Saúde (CNS), afirmou que considera que a declaração demonstra “explícita ameaça para comprometer o livre exercício das atividades regulatórias da Anvisa”.
Diante dessas e outras declarações do presidente, uma pesquisa Datafolha, divulgada no último domingo (16), mostrou que 58% dos brasileiros de 16 anos ou mais de idade acreditam que Bolsonaro mais atrapalha do que ajuda em relação à imunização das crianças. Em termos absolutos, o percentual equivale a 97,3 milhões de pessoas.
Um dia depois da divulgação do estudo, o ministro da Saúde afirmou, em entrevista à Jovem Pan, que o Brasil já registrou 4 mil óbitos que estariam comprovadamente relacionados à vacinação contra a covid-19.
O dado está errado. Até outubro de 2021, a Saúde registrou apenas uma morte “tendo como relação causal com as vacinas”. Questionado posteriormente sobre o dado, Queiroga afirmou que, na verdade, trata-se de casos em investigação.
Desde o início da pandemia, a covid-19 já matou mais de 620 mil brasileiros e infectou mais de 23 milhões, segundo dados do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass).
Publicação de: Brasil de Fato – Blog