Tânia Mandarino: Antes de fugir do Brasil, Bolsonaro finalmente reconhece que Maduro é o Presidente da Venezuela
Bolsonaro reconhece Maduro como presidente
Por Tânia Mandarino*
Veículos de imprensa estão noticiando que “Nicolás Maduro virá ao Brasil para a posse de Lula”.
O perfil “Central Eleitoral” anunciou nessa quinta-feira, 29/12, nas redes sociais que houve “forte insistência do futuro governo” e que seria publicada, ainda ontem, uma “portaria assinada por Ciro Nogueira revogando a proibição de o presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, pisar em solo brasileiro”.
Em pronunciamento transmitido pela CNN hoje pela manhã, dando como certa a vinda Maduro, Bolsonaro observou que quem está vindo para a posse de Lula é todo o pessoal do Foro de São Paulo e do Grupo de Puebla.
O site Metrópoles afirma categoricamente que “a liberação consta em portaria interministerial publicada nesta sexta-feira (30/12) no Diário Oficial da União. A publicação revoga outra portaria de 2019 que impedia a entrada no Brasil de altos funcionários do governo Maduro.”
De fato, a portaria, editada ontem (29), assinada por Antonio Ramirez Lorenzo e Alberto Franco França, respectivamente ministros de Estado da Justiça e Segurança Pública Substituto e das Relações Exteriores, foi publicada hoje (30) na edição 246, seção 1, página 276 do Diário Oficial da União:
A publicação da referida portaria, no apagar das luzes do governo Bolsonaro, ainda que muito tardiamente, repara uma injustiça histórica na qual, durante praticamente todo o período de duração do governo Bolsonaro, o Brasil não reconheceu Maduro como presidente da Venezuela e sim o impostor Juan Guaidó.
Quem não se lembra da tentativa de invasão à Embaixada oficial da Venezuela em novembro de 2019, quando seguidores de Guaidó tentaram expulsar o corpo diplomático legítimo dali para instalar o pessoal da embaixadora fake Maria Teresa Belandria, nomeada por Bolsonaro por indicação de Guaidó?
E da referida “embaixadora” violando nossa Constituição e o Estatuto da Criança e do Adolescente, franqueando acesso da turma de Bolsonaro às adolescentes venezuelanas sobre as quais Bolsonaro afirmara ter “pintado um clima” e serem “garotas de programa” porque estavam arrumadinhas num sábado, quem não se recorda?
Belandria chegou a aparecer em um vídeo com Michele e Bolsonaro para tentar limpar a barra do presidente sobre as conclusões de pedofilia que pesavam sobre ele nas redes às vésperas da eleição presidencial.
Após a frustrada tentativa de invasão da Embaixada Venezuelana, valentemente defendida por movimentos sociais como o MST e pessoas como Fabiano Trompetista e Paulo Pimenta, dentre outras, Bolsonaro perseguiu e expulsou o corpo diplomático de Maduro no Brasil.
A primeira ordem veio em plena pandemia e foi derrubada por um HC impetrado por Paulo Pimenta, por razões humanitárias nas quais o STF entendeu que não se põe pessoas pra correr assim, em pleno pico de pandemia, com aeroportos fechados e todas as dificuldades conhecidas num momento tão difícil.
Mas o STF deixou aberta a brecha para que, quando a pandemia arrefecesse, Bolsonaro pudesse fazer o que quisesse.
E foi o que aconteceu. Mais tarde Bolsonaro declarou personas non gratas todos os integrantes do corpo diplomático legítimo da Venezuela no Brasil, individualizando um a um, pessoalmente de modo que a Polícia Federal ingressou com inquéritos policiais de deportação contra cada um deles, que passaram a viver como se fossem ilegais no Brasil.
O fundamento adotado pela relatora Cármem Lúcia era de que “não cabe ao Poder Judiciário substituir-se ao Presidente da República nas decisões políticas acerca das relações internacionais do país e de desacreditação de diplomatas estrangeiros”.
E concluía que “diante disso, não se discute que os pacientes deixaram de ser representantes do governo venezuelano perante o Estado brasileiro e podiam ser considerados personae non gratae” declarando que “a decisão do Presidente da República, portanto, era válida e subsistente”.
Em votação unânime, acompanharam a ministra Cármen Lúcia os ministros Luiz Fux, Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli, Rosa Weber, Roberto Barroso, Edson Fachin, Alexandre de Moraes e Nunes Marques.
Cinco diplomatas venezuelanos, dentre eles a Encarregada de Negócios Internacionais, Irene Auxiliadora Rondon Graterol, têm passado um período terrível desde abril de 2021 no Brasil, exilados dentro da Embaixada, que afinal é território venezuelano, resistindo heroicamente, sem poder sair para nada, sob risco de serem descredenciados e humilhantemente deportados para a Venezuela.
A portaria interministerial publicada hoje revoga outra assinada pelo então ministro da justiça Sérgio Moro em 2019, juntamente com Ernesto Araújo do MRE, que dispunha sobre:
A situação descrita na portaria revogada demonstra o ódio que foi a marca do desgoverno fascista nos últimos quatro anos e do qual, com imensa alegria, estaremos nos livrando oficialmente no próximo domingo (31), com a festiva posse de Lula.
Com a revogação, nossos irmãos venezuelanos que resistiram tão bravamente, estão livres para acompanhar o novo embaixador venezuelano, indicado por Maduro, Manuel Vicente Vadell, que já está no Brasil, na posse do maior presidente de todos os tempos que este país já teve e novamente terá.
Quanto à vinda de Maduro para a posse, considero quase impossível que o Presidente da Venezuela venha para um país em que autoridades norte-americanas reservaram um hotel inteiro para se hospedar.
Em condições normais, sua vinda para o Brasil já demandaria pelo menos uma semana de antecedência, para os devidos rastreamentos e varreduras que antecedem a ida de qualquer presidente a um país estrangeiro.
Avalio, ainda, que, se Maduro viesse nas condições atuais sequer se hospedaria no Brasil, podendo passar apenas algumas horas, sem tocar em nada nem aceitar nada para comer ou beber…
Na Venezuela, país lindo de gente acolhedora e politizada, diz-se que na Cumbre Presidencial de Santa Marta (Colômbia), realizada em 2010, teriam inoculado tamanha irradiação nos aposentos de Chávez, que todos os presidentes latinos hospedados próximo a ele tiveram câncer.
Hugo Chávez e o então presidente da Colômbia, Juan Manuel Santos, na Cumbre de Santa Marta, em 2010. Foto: Prensa Miraflores
Observo que, em suas redes sociais, Nicolás Maduro segue mostrando que está bastante atarefado em seu país com a entrega de novas habitações populares de la Gran Misión Vivienda Venezuela, um projeto fascinante de moradias, que inspirou o Minha Casa Minha Vida no Brasil.
Não há como saber se Maduro vem ou não para a posse de Lula, mas é certo que a Revolução Bolivariana, mesmo com todos os percalços, bloqueios e sequestros de fundos impostos por países imperialistas, segue firme e forte na Venezuela, com quem certamente estreitaremos relações no novo governo popular de Luiz Inácio Lula da Silva.
As perseguições intentadas pelo governo fascista do Brasil entre 2019 a 2022 terminaram. Bolsonaro passou. A Venezuela passarinho.
Voa Brasil!
*Tânia Mandarino é advogada; integra o Coletivo Advogadas e Advogados pela Democracia (CAAD)
Publicação de: Viomundo