Manifestação reúne dez mil pessoas na Paulista contra ataques de Bolsonaro à democracia
Sob chuva intermitente e um frio de 16 graus, cerca de 10 mil pessoas ocuparam a av. Paulista nesta quinta (11), como parte do dia de mobilização nacional em defesa da democracia. A manifestação, batizada de “Defesa das Eleições Livres, da Democracia e pelo Fora Bolsonaro”, reuniu movimentos populares, partidos de esquerda, entidades estudantis e sindicais.
Em São Paulo, o dia começou na Faculdade de Direito da USP, com o lançamento dos manifestos “Carta às Brasileiras e aos Brasileiros em defesa do Estado Democrático de Direito”, elaborada por juristas, e da carta “Em Defesa da Democracia e da Justiça”, articulada pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), que conta com apoio de mais de 100 entidades de diversos setores.
Se ali a mobilização agregou uma frente tão ampla que juntou, no mesmo lugar, figuras como ex-bolsonarista Joice Hasselmann (PSDB), a artista Daniela Mercury, Guilherme Boulos (PSOL) e o ex-ministro Miguel Reale Jr., o ato em frente ao MASP teve um perfil bem mais coeso.
Entre os organizadores estão as dez centrais sindicais brasileiras, as Frentes Brasil Popular e Povo Sem Medo, que reúnem dezenas de movimentos populares, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra e a Central de Movimentos Populares (CMP).
Realizado no Dia do Estudante, que também marca o aniversário 85 anos de fundação da União Nacional dos Estudantes (UNE), o ato contou com forte mobilização do movimento estudantil. O movimento negro também marcou presença, com organizações como o Movimento Negro Unificado (MNU), Uneafro e Coalizão Negra por Direitos.
A concentração para a manifestação aconteceu às 17h em frente ao MASP. O ato cruzou a Paulista e se encerrou por volta das 20h, na Praça do Ciclista.
Além das bandeiras das entidades, destacavam-se cartazes cobrando a garantia de que as eleições serão respeitadas, com dizeres como “Respeite o voto, respeite o povo”, e uma urna eletrônica inflável gigante. Também apareciam bandeiras em defesa da candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), principal opositor de Bolsonaro.
No caminhão, lideranças como Guilherme Boulos (PSOL) e Sônia Guajajara (PSOL) se revezaram nas falasEles defenderam que o momento eleitoral que atravessamos é atípico, marcado por uma disputa maior do que aquela entre candidatos e programas: o que está em jogo é a continuidade do próprio regime democrático, ameaçado por Bolsonaro.
Para Josué Rocha, da coordenação do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) e da Frente Povo Sem Medo, o 11 de agosto “vai ficar marcado com um dia de luta em defesa da democracia”. “Depois de uma série de ataques de Bolsonaro às instituições, às liberdades democráticas e ao processo eleitoral, a sociedade reagiu como um todo, com muita unidade, indo para as ruas, se manifestando, construindo um manifesto com milhares de assinaturas, e mostrando que para a maior parte do povo brasileiro a democracia é um valor fundamental e vai ser defendida”, afirmou.
“A situação é tão ruim, tão extrema, o Bolsonaro representa tanto um retrocesso, que um cenário como hoje de manhã foi possível”, afirmou, a respeito da grande pluralidade do ato da São Francisco. “Mas isso não significa que a gente esteja abrindo mão das nossas pautas fundamentais. A gente sabe que a luta da democracia não pode ser uma luta vazia. Não vai existir democracia de fato enquanto não houver um combate profundo à desigualdade, ao racismo, enquanto não houver avanço em direitos sociais mínimos, como o direito a moradia, pelo qual o MTST luta tanto. Hoje a gente está junto, defendendo a democracia como um valor importante, até para que a gente possa ter o direito de continuar lutando por tantas e tantas outras pautas necessárias”, destacou Rocha.
O historiador Márcio Henrique Soares, membro da Uneafro, comparou o momento atual ao do lançamento da “Carta aos Brasileiros”, de 1977, quando um movimento liderado pelo professor Goffredo da Silva Telles Junior denunciou a ilegitimidade do governo militar.
“Aquele era um momento de pré-transição política, saindo da ditadura militar. Hoje, estamos correndo um sério risco de um retrocesso político, essa é que é a verdade. Ou seja, de um golpe de Estado. Não importa que seja um golpe branco, porque por trás dele tem forças políticas que apoiam, mas estão nas sombras”, pondera. “É responsabilidade da sociedade civil participar.”
Para ele, o tecido da democracia vem se esgarçando desde 2018, levando a uma situação cada vez mais difícil. “É um ano político eleitoral atípico do que vivenciamos anteriormente. Se for retroceder 10, 15 anos, nunca se viveu esse estado de tensão”, lamenta. “Estamos vivendo um momento político, econômico e social complicado, nada vivenciado nesse país antes. As coisas estão muito esgarçadas, as pessoas estão com os nervos à flor da pele, principalmente aquelas que teriam a obrigação de ter o bom senso e a responsabilidade de manter as coisas em ordem”, avalia Soares.
Apesar de não participar do ato, a vendedora ambulante Fábia Pereira, há três anos trabalhando na avenida Paulista, apoiava o que ouvia no carro de som. “A gente se identifica com a manifestação, a gente levanta a mão, vibra, mesmo de longe”, conta, agradecendo às “pessoas que se dispõem a fazer esse tipo de passeata, para gritar nas ruas que precisa de mudança, porque aqui quem manda somos nós, porque somos nós é que votamos.”
Ela considera que as urnas eletrônicas são seguras, ao contrário do que afirma Jair Bolsonaro. “É lógico que tem uma equipe técnica que faz todo o controle dos dados que ali são computados etc., e vão trazendo as informações de cada urna. Ou seja, não tem como fraudar, e não há porque duvidar da legalidade do processo”, afirma. “Na minha opinião, Bolsonaro está ficando louco, entrando em paranoia, porque ele sabe no fundo que não vai muito longe. Então ele começa a tentar fazer com que as pessoas entrem na paranoia dele.”
Publicação de: Brasil de Fato – Blog