Juliana Cardoso: Monotrilho paulista falha até em dia de inauguração de estação
Juliana Cardoso: “Falhas no monotrilho acontecem até em dia de inauguração de estação”
Por Juliana Cardoso*
A cena poderia ser digna de um filme pastelão. Às vésperas do ano novo, o governador em exercício do Estado de São Paulo, Rodrigo Garcia (PSDB), inaugurou a Estação Jardim Colonial da Linha 15-Prata do Monotrilho, situada em São Mateus, na periferia da zona leste de São Paulo.
Seria mais uma inauguração com todas as pompas dos propalados feitos do governo paulista se não fosse por um detalhe. Logo após entrar em operação às 4h de 29 de dezembro, as 10 estações entre São Mateus e Vila Prudente tiveram que fechar as suas portas.
O motivo foi uma falha no sistema de sinalização e controle, que interrompeu a circulação dos trens. Como é de praxe, dezenas de ônibus foram acionados para transportar os passageiros no trajeto. Técnicos conseguiram solucionar o problema por volta das 6h30.
Quase três horas depois foi entregue a estação Jardim Colonial, a 11ª a entrar em operação na Linha Prata que passa a ter 14,5 quilômetros de extensão a partir da Vila Prudente. Nesse intervalo centenas de passageiros enfrentaram dificuldades para chegar ao trabalho.
Falhas no monotrilho viraram rotina.
A Linha-15 Prata ficou com a operação paralisada durante 159 dias, de 2019 a outubro de 2019 do ano passado.
Em 2020, a Linha-15 ficou três meses completamente paralisada. Seus pneus explodiram e caíram na avenida, além de problemas na estrutura. Somente em 2021, ocorreram 41 interrupções parciais.
Em 2020 ficou três meses inoperante por causa de pneus que explodiram e desabaram na avenida, além de problemas na estrutura. Somente em 2021 foram 41 interrupções parciais.
Esses problemas têm origem na concepção do projeto. No mundo inteiro técnicos consideram o monotrilho um sistema de média capacidade e metrô de alta capacidade. Diferente do metrô, o monotrilho é sistema com trens menores dotados de pneus e que trafegam em vigas de concreto.
O monotrilho de São Paulo foi vendido pelo governo do Estado e empresas envolvidas em seu projeto como de alta capacidade. Foi projetado para transportar até 48 mil passageiros/hora sentido. O metrô transporta até 80 mil passageiros/hora/sentido.
O governo paulista continua a considerar o monotrilho como modal de alta capacidade. Quando a Linha Prata for concluída com mais três estações a promessa é transportar 550 mil passageiros/dia.
No mundo inteiro ninguém contabiliza monotrilho, VLT (Veículo Leve sobre Trilhos), ferrovia urbana ou outro meio de transporte como metrô, mas os governos tucanos fazem essa contagem
A ideia de construção do monotrilho surgiu em 2009 com o então prefeito Gilberto Kassab em parceira com o então governador José Serra. Técnicos do metrô não detêm até hoje sua tecnologia. Ela pertence ao consórcio construtor formado por empresas fabricantes dos trens.
Na época, a escolha do modal sofreu críticas de que a linha nasceria superlotada. Por isso, foi criado esse monotrilho de alta capacidade que não existe em nenhuma parte do mundo.
Para isso, a Bombardier desenvolveu projeto de trem maior e mais fortalecido para transportar mais passageiros. Além disso, as obras de engenharia tiveram de ser reforçadas para suportar o peso desses trens. E isso elevou os custos.
A opção pelo monotrilho foi um equívoco do governo estadual. Trata-se de uma experiência, pois o sistema não existia e havia risco de o projeto não atender ao que foi prometido.
A demanda estimada quando foi tomada a decisão, de 550 mil pessoas/dia, justificava a construção de metrô, pois o monotrilho estaria sobrecarregado.
Um trem de metrô como da Linha 3-Amarela pode transportar até dois mil passageiros, enquanto a composição da Linha 15 Prata tem capacidade de mil passageiros, a metade. A superlotação provoca grande número de falhas e panes do monotrilho, pois a sua eficiência não é equivalente ao metrô.
Outra promessa, a de que a construção teria baixo custo, não se efetivou. O custo inicial de R$ 3,5 bilhões para os 24,5 quilômetros até Cidade Tiradentes já passa dos R$ 6,4 bilhões.
Por esse valor daria para construir 12,8 quilômetros de metrô subterrâneo, com custo estimado por volta de R$ 500 milhões o quilômetro, conforme dados do próprio governo estadual.
Outros problemas são os atrasos nas obras. Em 2009 foi estabelecido prazo de cinco anos para a entrega dos 100 quilômetros iniciais das linhas do monotrilho. O trecho entre a Vila Prudente até o Terminal São Mateus era para estar pronto em 2011, depois foi prorrogado para 2013. Foi inaugurado somente em 2019.
Diante de tanta demora e altos custos, em 2015 nosso mandato protocolou requerimento na Câmara Municipal, para a instalação de Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) a fim de investigar os contratos e aditamentos das licitações na construção das duas linhas do monotrilho. Apesar de receber 22 assinaturas, três a mais do necessário, a CPI não prosperou.
Em contrapartida, aos trancos e barrancos, o monotrilho avançou em sua expansão, mesmo com as inúmeras falhas operacionais. Hoje, os milhares de passageiros dessa parte da zona leste pagam o preço por não ter metrô.
*Juliana Cardoso é vereadora (PT), vice-presidente da Comissão de Saúde da Câmara Municipal de São Paulo e integrante da Comissão de Defesa dos Direitos da Criança
Publicação de: Viomundo