Privatiza que melhora? Burguesia curitibana está no escuro há 28 horas

Os ricaços de Curitiba que apoiaram a privatização da Copel provaram do próprio veneno. Desde o temporal desta segunda-feira (22), bairros nobres da capital paranaense enfrentam um apagão que já dura 28 horas. A ironia é que muitos dos que defendiam a venda da companhia de energia, com o lema “privatiza que melhora”, agora amargam o escuro, e à luz de velas.

Um desses endinheirados, morador do Ecoville, bairro de marketing que na realidade chama-se Campina do Siqueira, confidenciou ao Blog do Esmael que está arrependido. Frequentador assíduo de restaurantes caros como Ile de France e Badida, ele reconhece que a privatização não trouxe eficiência alguma. Pelo contrário: além do aumento das tarifas, o tempo de restabelecimento da energia se alongou. Se antes a luz voltava em minutos, agora a demora é de dias.

Um dos fatores que explicam a piora no serviço, com apagões prolongados em Curitiba, é a perda da chamada “memória técnica” da Copel. Após a privatização, a companhia promoveu cortes de pessoal e dispensou trabalhadores mais experientes, que acumulavam décadas de conhecimento prático sobre a rede elétrica. Sem essa mão de obra qualificada, fundamental em situações de emergência, a empresa não tem conseguido responder com rapidez diante de eventos climáticos extremos, cada vez mais frequentes.

Ao longo do ano passado, a Assembleia Legislativa do Paraná (ALEP) promoveu diversas audiências públicas com representantes dos setores produtivos, que há tempos vêm sentindo na pele os prejuízos causados pelos apagões da Copel. Produtores rurais, industriais e comerciantes relataram perdas bilionárias com a deterioração da qualidade do fornecimento de energia após a privatização. Agora, o que antes afetava sobretudo o campo e a periferia urbana alcança também a burguesia curitibana, obrigada a experimentar o mesmo drama que já castigava agricultores, pequenas empresas e trabalhadores.

A controversa privatização da Copel ocorreu em agosto de 2023, quando o governo Ratinho Junior (PSD) abriu mão do controle da maior empresa do Paraná em uma operação de R$ 4,53 bilhões na Bolsa de Valores de São Paulo. Vendidas a R$ 8,25 cada, as ações pulverizaram o capital da companhia, seguindo o mesmo modelo aplicado na Eletrobras. O Estado reduziu sua participação de 31% para cerca de 15%, mantendo apenas uma “golden share” com poder de veto. À época, o governador prometeu que a desestatização traria eficiência e modernização, mas os indicadores da ANEEL mostraram o contrário: o tempo médio de atendimento das ocorrências saltou 34,4% em apenas um ano, e as interrupções no fornecimento cresceram, confirmando os alertas feitos por engenheiros e sindicatos de que a Copel privada priorizaria dividendos e remunerações milionárias em detrimento da qualidade do serviço.

A burguesia do Ecoville, do Água Verde e do Batel, acostumada a exigir “serviço de primeiro mundo”, não imaginava ficar tanto tempo no escuro. Se para os bacanas o apagão já é insuportável, imagine a situação das famílias das periferias, nos bairros mais distantes, sem o mesmo poder de pressão ou recursos para improvisar.

Para completar o cenário, alguns desses burgueses passaram a reclamar que a velha mídia estaria escondendo a real dimensão do apagão, que já ultrapassa 28 horas e mergulha Curitiba no escuro. Acostumados a ver seus bairros destacados nos jornais e telejornais, eles agora acusam os jornalões de minimizar o drama por conveniência política, numa tentativa de blindar a privatização da Copel.

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“Privatiza que melhora?”, ecoa a pergunta nos grupos de WhatsApp da elite curitibana. O arrependimento vem acompanhado de uma guinada inesperada: depois do choque do apagão, alguns desses mesmos setores já falam em encampar novamente a Copel, caso a conjuntura política permita após as eleições de 2026.

O caso revela o fracasso da lógica privatista que transformou a Copel em mercadoria, sacrificando o interesse público em nome do lucro. O apagão da burguesia é, na verdade, o retrato de um modelo que penaliza sobretudo os mais pobres.

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Publicação de: Blog do Esmael

Lunes Senes

Colaborador Convidado

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