Chico Alves comprova o que a Fepal denuncia há 49 dias sobre a cobertura da Globo: Na tela do JN, Israel 7, Palestina 1
Na tela do JN, Israel vence a Palestina por 7 a 1
Não se ouviu o lamento dos familiares das 39 pessoas que Israel manteve presas por tanto tempo
Por Chico Alves, no ICL Notícias
Foi reveladora a edição de ontem do Jornal Nacional, o noticiário televisivo de maior audiência do país.
Como assunto principal, a libertação de reféns por parte do Hamas e a soltura dos palestinos mantidos presos de forma ilegal por Israel.
Se ainda resta dúvida sobre a parcialidade da imprensa brasileira nesse conflito, talvez a cronometragem do tempo de cobertura gasto no JN para um caso e para outro seja uma forma objetiva de esclarecer a questão.
Para relatar a liberação dos reféns israelenses e o retorno às suas famílias foram gastos 7 minutos e 44 segundos.
No caso da soltura dos palestinos presos ilegalmente em Israel, a cobertura durou somente 1 minuto e 4 segundos.
Mas os 7 a 1 com que Israel se sobrepôs aos palestinos no JN não se limita à diferença de tempo.
É muito mais fácil para o público estabelecer empatia com os israelenses que foram sequestrados e seus familiares, já que o sofrimento deles é contado em detalhes.
A audiência da edição de ontem do Jornal Nacional viu uma mulher em Tel Aviv falando do alívio pela libertação dos reféns; acompanhou a expectativa de Benjamin Netanyahu; soube do estado de saúde dos israelenses e das orientações dos militares do governo sobre como falar com as crianças sem traumatizá-las; assistiu manifestação de euforia, com canto e dança, nas ruas de Israel e observou ao vivo a chegada do ministro Benny Gantz ao local onde estavam os parentes dos libertados.
Além dessa riqueza de detalhes, algo que não houve em relação aos palestinos que estavam presos ilegalmente em Israel, o telejornal da Globo fez pequenos perfis dos reféns que retornavam, com seus dramas pessoais.
“Ao longo da tarde, o mundo foi conhecendo os detalhes dos primeiros reféns liberados pelos terroristas do Hamas”, anunciou a apresentadora.
A partir daí, o público de milhões de brasileiros ligado no JN acompanhou histórias como: a da senhora de 85 anos sequestrada em um kibutz e levada em um carrinho de golfe; a da outra idosa de 72 anos que viu o marido ser assassinado; a da voluntária de um hospital, com 55 anos, que tem problemas de câncer; a da mulher e sua filha de 5 anos liberadas que têm outros 5 parentes sequestrados; a da mulher com duas filhas cujo marido tinha feito um apelo aos terroristas, a do menino que fez nove anos no cativeiro e foi libertado junto com a avó e a mãe; a da mulher de 79 anos, com diabetes e a de outra senhora, que tinha sido dada como morta.
Até sobre um dos tailandeses e um dos filipinos libertados pelo Hamas, como parte de outro acordo com o Catar, o JN conseguiu dar alguma referência.
Aos palestinos libertados da prisão ilegal imposta por Israel, o tratamento dado foi bem diferente.
Sobre a jovem Marah Bakir, que aparece em um vídeo rápido abraçando uma parente, a locutora diz apenas que ela tem 24 anos e foi presa em 2015 por esfaquear um policial na fronteira.
O programa também exibiu cenas rápidas de um adolescente palestino que voltou para casa depois de ser preso, segundo o JN, por arremessar uma bomba caseira.
Ao contrário dos reféns israelenses, as referências sobre aqueles que foram liberados na Cisjordânia vinham apenas de sua ficha criminal.
No caso de Marah Bakir, o perfil da Federação Árabe Palestina do Brasil (Fepal) na plataforma X informa que quando foi presa, aos 17 anos, ela voltava da escola e foi alvo de tiros disparados por soldados israelenses. As circunstâncias da prisão não foram citadas no JN. Ela seria, então, uma vítima adolescente que tentava se defender, e não agressora.
Reencontro de Marah Bakir com uma integrante da família. Foto: Redes sociais
Sempre haverá quem argumente que a informação divulgada pela federação é parcial, e por isso inconfiável.
Mas é possível considerar confiável o que diz o governo de Israel, que viola tantas leis e tratados internacionais (sem falar nas premissas mais básicas de civilidade)?
No JN de ontem, não se ouviu o lamento dos familiares e amigos das 39 pessoas que Israel manteve presas por tanto tempo, nada foi dito sobre a emoção do reencontro depois de tantos anos de cativeiro, nenhum relato sobre a violência do governo israelense, que prende palestinos sem acusação formal e sem levá-los a julgamento.
Para quem se preocupa com justiça e direitos humanos e assistiu à edição de ontem do telejornal da Globo, ficou impossível ter uma “boa noite”, como desejaram os apresentadores ao fim de mais uma edição.
PS do Viomundo: Desde a manhã de 7 de outubro, a Federação Árabe Palestina do Brasil — Fepal– buscou a Rede Globo de Televisão para falar sobre a Palestina.
”Só defensores do apartheid israelense têm tido espaço na programação para falar, inclusive ao vivo”, denunciou Ualid Rabah, presidente da Fepal, ao Viomundo.
”É uma verdadeira propaganda de guerra!”, apontou. “Crime de lesa-humanidade, conforme o Direito Internacional.”
Diante disso, na noite de domingo, 08/10, a Fepal postou X/Twitter um fio com sete mensagens, cobrando publicamente da Globo que ouvisse também a voz palestina.
Infelizmente, em vão, como mostra o artigo de Chico Alves, editor-chefe do site do ICL Notícias.
Publicação de: Viomundo