Em carta aberta, deputados portugueses advertem para ameaças sistemáticas de Bolsonaro à democracia e incitação da violência

Da Redação
Neste domingo, 25-09, deputados portugueses divulgaram uma carta aberta, na qual manifestam “profunda preocupação” com os ataques do presidente Jair Bolsonaro (PL) à democracia, ao Supremo Tribunal Federal (STF), ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e ao sistema de votação.
Intitulada Carta aberta — Solidariedade com os democratas do Brasil, ela foi publicada no jornal Público.
Vinte e quatro deputados a subscrevem — a maioria de partidos de esquerda.
No texto, citam também a disseminação de informações falsas por parte de Bolsonaro e dizem temer uma escalada de violência.
“O risco de violência política é ainda maior para candidatos de populações vulneráveis, incluindo mulheres, LGBTIQ+, indígenas, e comunidades afro-brasileiras”, observam os deputados portugueses na carta aberta.
“Portugal tem o dever de estar atento a todas as iniciativas que ameacem incitar à violência política no país e minar a integridade do seu processo eleitoral”
Carta Aberta – solidariedade com os democratas do Brasil
Portugal tem o dever de estar atento a todas as iniciativas que ameacem incitar à violência política no país e minar a integridade do seu processo eleitoral. Um texto subscrito por 24 deputados do Parlamento português.
“Com a aproximação das eleições no Brasil, marcadas para dia 2 de Outubro, manifestamos a nossa profunda preocupação com as ameaças sistemáticas às instituições democráticas.
O sistema de votação eletrónica tem sido alvo de ataques por parte do Presidente Jair Bolsonaro, tendo como objetivo disseminar desinformação sobre a legitimidade e integridade dos processos eleitorais, e atacar publicamente as entidades eleitorais independentes.
À luz destes graves e demasiado familiares desafios à democracia do Brasil, Portugal tem o dever de estar atento a todas as iniciativas que ameacem incitar à violência política no país e minar a integridade do seu processo eleitoral.
Em 18 de Julho de 2022, numa reunião com o corpo diplomático, o Presidente Bolsonaro declarou que “o sistema (eletrónico) é completamente vulnerável”, sem apresentar qualquer prova de fraude.
Esta não foi a primeira vez que tentou desacreditar as instituições eleitorais brasileiras. Nos últimos anos, tem promovido ativamente uma campanha que põe em causa o sistema eletrónico, atacou a imparcialidade do Supremo Tribunal Federal e do Supremo Tribunal Eleitoral do Brasil, e ameaçou que só terminaria o seu actual mandato sendo “preso, morto ou vitorioso”.
A retórica imprudente e perigosa de Jair Bolsonaro sobre a fraude eleitoral suscita sérios receios sobre uma transferência pacífica de poder se perder. Em Junho, prometeu “ir para a guerra” se necessário para impedir uma eleição “roubada”.
A 7 de Setembro de 2021, exortou os seus apoiantes a atacar o Supremo Tribunal do país. O Presidente Bolsonaro apelou também às forças armadas para que interviessem no processo eleitoral, conduzindo uma contagem paralela dos votos, uma função constitucionalmente reservada à Justiça Eleitoral do Brasil.
Ao fazê-lo, põe em risco os mandatos constitucionais e a neutralidade dos militares, uma preocupação significativa, dadas as recentes declarações de líderes militares brasileiros de alto nível, tais como o chefe da Marinha do Brasil, aparentemente apoiando as alegações de fraude eleitoral do Presidente Bolsonaro.
À medida que as eleições brasileiras se aproximam, registamos com preocupação o risco significativo que tal retórica e ações representam para a perspetiva de um processo eleitoral pacífico. O chefe do Tribunal Eleitoral brasileiro advertiu em Julho que o país corre o risco de sofrer distúrbios, mesmo mais graves do que a insurreição de 6 de Janeiro, no Capitólio nos EUA, e já há provas de que a violência política está a aumentar acentuadamente.
O risco de violência política é ainda maior para candidatos de populações vulneráveis, incluindo mulheres, LGBTIQ+, indígenas, e comunidades afro-brasileiras. De acordo com um inquérito conduzido pelo Instituto Marielle Franco, quase 100% dos candidatos negros declararam estar sujeitos a pelo menos um tipo de violência política nas eleições de 2020.
Esta realidade é exacerbada pelo aumento dramático do número de armas em circulação no Brasil desde que Bolsonaro tomou posse, o que já levou à ocorrência de assassinatos durante o decorrer da campanha.
Num momento tão perigoso para a democracia em todo o mundo e num momento tão crucial para a democracia brasileira em particular, estamos solidárias e solidários com os milhões de brasileiros de todo o espectro político, incluindo centenas de líderes da sociedade civil, religiosos, políticos e empresariais, que denunciaram publicamente as ameaças à democracia do Brasil.
Devemos repudiar todas as tentativas de rejeitar os resultados eleitorais, de reprimir manifestações públicas pacíficas, de prejudicar a capacidade dos grupos minoritários de exercerem com segurança os seus direitos políticos, de atacar a imprensa e os defensores dos direitos humanos, de instigar os políticos à violência ou de fazer com que as Forças Armadas interfiram no processo eleitoral.
Como deputados da Assembleia da República, comprometemo-nos a continuar a trabalhar para assegurar que as históricas e importantes relações de amizade e de cooperação entre Portugal e o Brasil continuem a assentar num compromisso partilhado com os valores democráticos e os direitos humanos, começando pelo respeito absoluto por eleições livres e justas.
Lisboa, Setembro de 2022
Subscrevem:
Alexandra Leitão — Deputada Partido Socialista
Alma Rivera — Deputada Partido Comunista Português
Capoulas Santos — Deputado Partido Socialista
Diogo Leão — Deputado Partido Socialista
Edite Estrela — Deputada Partido Socialista
Eunice Pratas — Deputada Partido Socialista
Francisco César — Deputado Partido Socialista
Inês Sousa Real — Deputada Pessoas Animais e Natureza
Isabel Moreira — Deputada Partido Socialista
Jamila Madeira — Deputada Partido Socialista
Joana Mortágua — Deputada Bloco de Esquerda
João Dias — Deputada Partido Comunista Português
José Soeiro — Deputado Bloco de Esquerda
Maria João Castro — Deputada Partido Socialista
Mariana Mortágua — Deputada Bloco de Esquerda
Nathalie Oliveira — Deputada Partido Socialista
Paulo Pisco — Deputado Partido Socialista
Pedro Filipe Soares — Deputado Bloco de Esquerda
Porfírio Silva — Deputado Partido Socialista
Ricardo Lino — Deputado Partido Socialista
Romualda Fernandes — Deputada Partido Socialista
Rui Tavares — Deputado Livre
Susana Correia — Deputada Partido Socialista
Tiago Barbosa Ribeiro – Deputado Partido Socialista
Os autores escrevem segundo o novo acordo ortográfico
PS do Viomundo: O Público é um jornal diário matutino português fundado em 1990.
Publicação de: Viomundo