Valter Pomar: Banco Central, o nó do problema
Banco Central: o nó do problema
Saiu mais uma pesquisa de opinião.
Várias pessoas comemoraram o resultado.
Acontece que o resultado é o seguinte: depois de um imenso esforço nosso, apenas das grandes diferenças em relação ao governo anterior, seguimos mais ou menos no mesmo lugar.
Por quais motivos isto acontece?
Essencialmente por erros na nossa atuação política. O que inclui erros na “economia política” do nosso governo.
Essa economia política – assim como toda a nossa linha política, desde 2022 – parte do princípio de que devemos buscar um acordo com setores do lado de lá.
No caso da economia, o acordo incluiu fazer uma troca. O governo adotaria uma política fiscal ortodoxa e, em compensação, o Banco Central afrouxaria na política de juros.
O governo cumpriu sua parte. O Banco Central, não!
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A taxa de juros caiu, mas caiu muito pouco. Resultado: desestimula o investimento produtivo privado e sufoca o investimento publico.
Por esses e por outros motivos, nos últimos dias o presidente Lula voltou a fazer duras críticas ao Banco Central.
Retomou aquilo que o próprio Lula dizia no início do governo, antes de Haddad conseguir arrancar um (péssimo) armistício.
E o que fez o Banco Central, depois das críticas de Lula?
O BC manteve a taxa de juros.
Posição unânime, com o voto a favor inclusive dos indicados pelo presidente Lula.
O que fizeram Lula e Haddad?
O primeiro manteve (ainda bem) as críticas, o segundo (como de costume) contemporizou.
E, para completar a bancada petista…
… recorreu à justiça para que Bob Fields Neto seja proibido de fazer “pronunciamentos de natureza político-partidárias”.
Cá entre nós: votamos contra a suposta autonomia do Banco Central.
(Suposta porque é uma autonomia em relação à decisão do povo na eleição presidencial, mas não é uma autonomia em relação ao mercado financeiro.)
Mas a lei aprovada, contra a qual votamos, estabelece procedimentos para substituir o presidente indicado pelo cavernícola.
Ao invés de seguir por este caminho, preferimos criticar ou contemporizar.
E adotamos a tática Jack the Ripper: por partes.
Até agora, salvo engano, nomeamos 4 diretores do Banco Central.
Mas estes 4 votaram pela manutenção da taxa de juros.
(Detalhe: a unanimidade é uma opção. Em outros momentos, diretores – inclusive os indicados por Lula – votaram contra a maioria. Isso faz parte da dinâmica. O voto unânime agora foi uma opção política.)
A malta esperava que os indicados por Lula contribuíssem para mudar a política do Banco Central.
Mas, como se viu, volta e meia os indicados preferem compor com o lado de lá.
Algo parecido com o que aconteceu, entre 2003 e 2016, com boa parte dos nomes que indicamos para o STF.
Todo mundo lembra no que deu.
Alguém pode dizer: quando tivermos maioria, quando nomearmos o novo presidente…
Pois bem: se aproxima a hora do presidente Lula colocar no BC um presidente favorável à quebrar o garrote.
Preocupado com isso, o lado de lá exige um “técnico ilibado”.
Já o lado de cá clama por um presidente sintonizado com a política vitoriosa nas urnas de 2022.
Sendo assim, pergunto: é mesmo hora de entrar na justiça, contra “pronunciamentos de natureza político-partidárias”?
Nada contra entrar na justiça, embora o bom mesmo fosse acionar o mecanismo que permite tirar o presidente do BC, mesmo antes do final de seu mandato.
Mas qual objetivo perseguimos, ao entrar na justiça contra “pronunciamentos de natureza político-partidária”, num país onde a elite, o oligopólio da mídia e a justiça tratam como “partidário” todo posicionamento político que seja à favor do povo?
Denunciar que o Bob Fields tem lado?
Evitar que associem Bob Fields e seus altos juros com o lado de lá?
Constranger por menos quem não se constrange por mais?
Enfim, é muita confusão, parte da qual resulta da incapacidade de localizar o nó do problema.
E o nó do problema está em que não deveríamos ter acreditado, nunca, que seria possível um modus vivendi com esta gente.
Ou nossa parte do Brasil acaba com o austericídio, ou o austericídio acaba com a nossa parte do Brasil.
Não tem meio-termo.
*Este texto não representa obrigatoriamente a opinião do Viomundo.
Publicação de: Viomundo