Ruben Bauer Naveira: A nova guerra da Ucrânia

Por Ruben Bauer Naveira*

Discretamente, silenciosamente, a guerra da Ucrânia passou por uma transformação de natureza, e poucos perceberam.

A Ucrânia não tenciona mais “vencer” a guerra, no campo de batalha. Ela sabe que essa possibilidade não existe mais.

“Vencer”, para a Ucrânia, significa agora obrigar a Rússia a desistir de derrotá-la. Como? Impondo-lhe um custo econômico insuportável, até que ela finalmente concorde com algum tipo de cessar-fogo e de congelamento do conflito na atual linha de frente.

Três novas “frentes de batalha” se alinham nesse sentido:

– A Ucrânia procura atingir com seus drones as refinarias de petróleo na profundidade russa, e implora pelo fornecimento de mísseis de longo alcance (como os Tomahawks) que permitam a ela ampliar esses ataques;

– Os Estados Unidos buscam sancionar todos aqueles que compram petróleo e derivados russos, na esperança de vir a estrangular a economia russa; e

– a OTAN busca meios de inviabilizar a navegação dos petroleiros que tansportam petróleo e derivados russos.

Vejamos a resposta russa a cada uma delas.

A Rússia está retaliando desproporcionalmente a cada drone lançado contra uma refinaria sua, devastando por completo a infraestrutura ucraniana, na prática remetendo o país de volta à idade da pedra. Uma vez que toda esta destruição se dá em solo ucraniano, e não europeu, o Ocidente a aceita e assimila. E a Ucrânia, que poderia (deveria) pretender sobreviver, dobra a aposta, entregando-se bovinamente ao extermínio do seu próprio futuro.

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Os mísseis ocidentais até poderão acabar vindo, porém somente ao risco de transpor as “linhas vermelhas” dos russos, e arriscar expandir a guerra para além das fronteiras ucranianas. Por isso Trump recuou (por enquanto) quanto aos Tomahawks. Essa possibilidade permanece assim em aberto.

Os drones impõem danos ao refino russo? Sem dúvida, mas, em que medida? Até o momento os danos parecem estar sendo absorvidos. Drones a grandes distâncias necessitam carregar mais combustível do que explosivos, e a maioria deles não sobrevive às defesas antiaéreas russas. Exatamente por isso toda a cantilena a respeito de mísseis.

As sanções ao comércio de petróleo russo podem acabar tendo o efeito de elevar os preços do petróleo, e assim fazer com que os russos lucrem mais com menores volumes vendidos, uma coisa compensando a outra.

Finalmente, as restrições à livre-navegação pelos petroleiros consistirão, na prática, em atos de pirataria, contra os quais os russos já anunciaram que adotarão retaliações militares.

Providências antieconômicas, como passar as embarcações para operação sob bandeira russa (ao invés de bandeiras de baixo custo, como a liberiana) bem como passar a segurá-las sob bancos russos (ou chineses), de modo a garantir uma proteção formal, já se encontram em curso.

Visualizo apenas dois possíveis cenários de desdobramento para este curso de coisas:

1) (o mais provável) A Rússia “aguenta o tranco” dos prejuízos econômicos e dos danos em suas refinarias, e prossegue metodicamente com a destruição daquilo que ainda resta da infraestrutura para a vida civil e do exército ucranianos. Que não se espere que isso obrigue a Ucrânia a capitular ou que leve a população a sublevar-se. O mais provável é que haja migração em massa da população civil — e que a guerra prossiga 2026 adentro.

2) O estrangulamento da economia russa faz efeito, e a obriga a fazer aquilo que ela não quer: desistir de cumprir com os seus objetivos militares.

Um tal cenário importaria riscos existenciais para a Rússia, como o de enfraquecimento do seu governo com margem para que venha a ser derrubado, para instalação de algum outro governo mais pró-ocidental.

Se a História ensina alguma coisa, apostar contra a disposição do povo russo de resistir e de lutar até o final não parece muito prudente — ainda mais após os russos terem modernizado e ampliado — e em muito — as suas capacidades nucleares ao longo da última década, como se estivessem se preparando para a eventualidade de um momento de tudo-ou-nada.

*Ruben Bauer Naveira  é ativista, pacifista e autor do livro Uma Nova Utopia para o Brasil: Três guias para sairmos do caos.

Este artigo não representa obrigatoriamente a opinião do Viomundo.

Publicação de: Viomundo

Lunes Senes

Colaborador Convidado

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