Ministério da Agricultura libera registro no Brasil de 30 novos agrotóxicos — em plena COP30

Banidos lá fora, liberados aqui: durante a COP30, Ministério da Agricultura autoriza 30 novos agrotóxicos no Brasil

Mapa abriu a porteira para novos componentes químicos, alguns deles proibidos na União Europeia

Por Carolina Bataier* no BdF

Não bastasse o Brasil ser o país que mais consome agrotóxicos no mundo, o Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) liberou 30 novos tipos de veneno para uso interno.

A autorização, divulgada na última terça-feira (11), um dia após o início da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP30), é mais um exemplo das contradições entre o discurso de defesa ambiental e as decisões políticas influenciadas pelo lobby do agronegócio, como avalia Jakeline Pivato, da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida.

“Enquanto se vende lá fora uma imagem de sustentabilidade, aqui dentro segue essa política de contaminação e de falta de controle”, diz, em entrevista ao Brasil de Fato durante a programação da Cúpula dos Povos, movimento paralelo à programação oficial da COP30, em Belém. “O Brasil segue marcando sua posição de maior consumidor de venenos do mundo. Um mercado que segue em expansão, enquanto a gente está aqui, mundialmente representados, contestando as falsas soluções.”

Na lista dos agrotóxicos liberados pelo Departamento de Sanidade Vegetal e Insumos Agrícola da Secretaria de Defesa Agropecuária, do Mapa, estão componentes proibidos na União Europeia, onde os limites resíduos são extremamente rígidos.

Entre as substâncias dos produtos registrados estão a azoxistrobina e a trifloxistrobina, ambas associadas à má-formação fetal e problemas neurológicos. A aprovação inclui um novo tipo de glifosato, associado a potenciais efeitos cancerígenos, reprodutivos e endócrinos.

Também estão entre as substâncias aprovadas clocernapir, S-metolacloro, protioconazol, entre outras, todas com impactos já reconhecidos: toxicidade para peixes e aves, contaminação de águas subterrâneas, resistência de fungos e riscos diretos à saúde humana.

“É um escárnio”, define Paulo Petersen, da Articulação Nacional de Agroecologia (ANA), que também participa da programação na Cúpula dos Povos.

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“É uma mensagem dizendo assim: vocês estão fazendo a COP 30, nós vamos lançar 30 agrotóxicos aqui. Não foram 29, não foram 31. Eu acho que isso precisa ser denunciado”, diz.

Na tenda, uma das áreas organizadas para o debate sobre a agricultura familiar, cartazes e bandeiras dão o recado: agrotóxico mata Foto: Carolina Bataier/Brasil de Fato

‘Uso de agrotóxicos está relacionado ao modelo de agricultura’

Na quinta-feira (14), Pivato e Petersen participaram de debates em uma tenda erguida sobre o gramado da Universidade Federal do Pará (UFPA), a poucos metros da beira do rio Guamá, na programação da Cúpula dos Povos.

Até o dia 16 de novembro, circularão pelo local mais de 15 mil pessoas, entre indígenas, quilombolas, sem terras, ribeirinhos e outros tantos povos e comunidades tradicionais, que trouxeram para a Cúpula, as suas experiências e denúncias.

Entre os problemas enfrentados por essas populações, está a contaminação por agrotóxicos. Muitas comunidades ficam próximas a lavouras de monocultura – que avança a passos largos no Brasil, onde mais de 70% das áreas de uso agrícola são ocupadas por plantações de commodities, como soja, milho e outros produtos cultivados em larga escala, com uso de agrotóxicos.

Na tenda, uma das áreas organizadas para o debate sobre a agricultura familiar, cartazes e bandeiras dão o recado: agrotóxico mata.

“O uso de agrotóxicos está relacionado ao modelo de agricultura, que é o monocultivo. No monocultivo, os agrotóxicos fazem parte daquilo que, entre aspas, é necessário”, ressalta geógrafa Larissa Mies Bombardi, pesquisadora do Laboratório de Agroecologia da ULB (Universidade Livre de Bruxelas) e autora do “Atlas Geográfico do Uso de Agrotóxicos no Brasil e Conexões com a União Europeia”.

Na terça-feira pela manhã, a pesquisadora participou de um ato alertando para a necessidade do banimento dos HHPs, sigla em inglês que significa agrotóxicos altamente tóxicos, com a instalação de um inflável de 12 metros no gramado do evento.

“Pesticidas: aquecendo o planeta, envenenando o futuro”, diz mensagem em inflável de 12 metros na Cúpula dos Povos Foto: Gaia Penteado/De Olho nos Ruralistas

“São essas substâncias, que são banidas na União Europeia. E a gente clama pelo banimento imediato mundial dos HHPs, porque não é possível que a gente continue sabendo do efeito dessas substâncias, tolerando que alguns povos estejam sujeitos a elas enquanto outros não”, alerta.

Participante da Cúpula dos Povos, Bombardi avalia o espaço como essencial para o debate sobre o uso de agrotóxicos no Brasil.

“Aqui a gente tem a comunhão de tantos movimentos sociais, de entidades da sociedade civil organizada. E por esse caminho a gente consegue transformações, a gente consegue mudanças, não conheço outro caminho. Os governos vão se mover em função de como a gente se posiciona”, diz.

O Brasil de Fato entrou em contato com o Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) sobre o tema, mas não obteve retorno até a publicação desta reportagem. O espaço segue aberto.

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Publicação de: Viomundo

Lunes Senes

Colaborador Convidado

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