Marcelo Zero: A estratégia bilateral vencedora de Putin e a ruína de Zelensky
A Estratégia Bilateral Vencedora de Putin e a Ruína de Zelensky
Por Marcelo Zero*
Zelensky não está em boa situação. Está entre a “espada de aço” e a “privada de ouro”.
Em primeiro lugar, Zelensky perdeu a guerra, uma guerra que ele poderia ter terminado já em abril de 2022, em condições mais vantajosas que as de agora e com um número de vítimas muito menor.
Foi convencido, no entanto, por Boris Johnson, por Biden e pela obsoleta e lamentável Otan a persistir numa guerra inútil, com a promessa de apoio incondicional e vitória certa.
Quebrou a cara. Apesar da resistência e da tentativa (fracassada) de uma contraofensiva, a Ucrânia viu-se atolada numa guerra de desgaste (attrition warfare), que a vem fazendo perder ainda mais território e um número irreparável e insubstituível de soldados.
Perdeu 24% de seu território (e continua a perder) e não tem mais capacidade para repor os mortos e aqueles que se tornaram incapacitados para servir.
Os analistas objetivos e com um mínimo de informação, como Jeffrey Sachs e John Mearsheamer, sabem disso há muito tempo. Macron e outros, no entanto, não receberam o “claro memorando”.
Além de ter perdido a guerra com a Rússia, Zelensky está perdendo a guerra interna. Desencadeou-se, como se sabe, um grande escândalo de corrupção na Ucrânia. Dinheiro de ajuda externa destinado para dar segurança à usina Zaporizhia e resolver problemas graves de energia, teria sido desviado.
Dezenas de milhões de dólares, que foram parar, por exemplo, no banheiro de Tymur Mindich, amigo de Zelensky e diretor da companhia de energia Energoatom. Foi parar, mais especificamente, numa privada de ouro, ou banhada a ouro.
Apoie o VIOMUNDO
A tal banheira se transformou no grande símbolo de corrupção do governo de Zelensky, enfurecendo a população ucraniana, indignada com um desvio desse tamanho, ao todo US$ 100 milhões, em tempos de guerra.
Assim, Zelensky está emparedado entre a espada de ferro da Rússia e a banheira de ouro da corrupção interna.
Tem de negociar.
Pois bem, os pontos do acordo exibidos até agora divulgados (28) impõem uma derrota política à Ucrânia e à Otan, mas parecem pontos realistas e incontornáveis.
Ademais, como explico mais adiante, o acordo interessa muito aos EUA e a Trump. Na realidade, trata-se, fundamentalmente, de um acordo bilateral Rússia-EUA, no qual Zelensky e a Otan entram como atores secundários.
No que tange à questão dos territórios, por exemplo, o assunto mais delicado, o acordo determina que Crimeia, Luhansk e Donetsk serão reconhecidos como de fato russos, inclusive pelos Estados Unidos.
Já Kherson e Zaporizhia serão “congelados” ao longo da linha de contato, o que significa reconhecimento de fato dos territórios dominados pela Rússia até a linha de frente.
A Rússia, contudo, renunciará a outros territórios acordados que controla fora das cinco regiões.
As forças ucranianas se retirarão da parte do Oblast de Donetsk que atualmente controlam, e essa zona de retirada será considerada uma zona neutra desmilitarizada, reconhecida internacionalmente como território pertencente à Federação Russa. As forças russas não entrarão nessa zona desmilitarizada.
No campo das garantias, um acordo abrangente de não agressão será concluído entre Rússia, Ucrânia e Europa. Todas as ambiguidades e atritos dos últimos 30 anos serão considerados resolvidos.
Espera-se, de um lado, que a Rússia não invada países vizinhos e que, de outro, a Otan não se expanda mais.
Ademais, um diálogo será realizado entre Rússia e Otan, mediado pelos Estados Unidos, para resolver todas as questões de segurança e criar condições para a desescalada militar, garantindo segurança global e aumentando oportunidades de cooperação e desenvolvimento econômico futuro.
A Ucrânia receberá garantias de segurança confiáveis, providas pelos EUA.
O acordo será juridicamente vinculante. Sua implementação será monitorada e garantida por um Conselho da Paz, presidido pelo Presidente Donald J. Trump. Sanções serão impostas em caso de violações.
A Rússia será reintegrada à economia global e será convidada a retornar ao G8. O levantamento das sanções será discutido e acordado em etapas e caso a caso.
Mas os pontos mais interessantes do acordo tangem aos aspectos econômicos, que colocam, com centralidade, os interesses dos EUA. Esses são os pontos que deverão fazer o acordo se tornar realidade.
Os Estados Unidos entrarão em um acordo de cooperação econômica de longo prazo com a Rússia para desenvolvimento mútuo nas áreas de energia, recursos naturais, infraestrutura, inteligência artificial, data centers, projetos de extração de metais raros no Ártico e outras oportunidades corporativas mutuamente benéficas.
Além disso, os fundos congelados da Rússia serão usados da seguinte forma: US$ 100 bilhões em ativos russos congelados serão investidos em esforços liderados pelos EUA para reconstruir e investir na Ucrânia. Os EUA receberão 50% dos lucros dessa iniciativa.
A Europa adicionará US$ 100 bilhões para aumentar o valor do investimento disponível para a reconstrução da Ucrânia.
O restante dos fundos russos congelados será investido em um instrumento de investimento separado EUA-Rússia para implementar projetos conjuntos em áreas específicas. Esse fundo visa fortalecer as relações e aumentar interesses comuns para criar um forte incentivo para “não retornar ao conflito”.
Em outras palavras, os EUA de Trump pretendem lucrar muito com o acordo, com a reconstrução da Ucrânia e com um futuro tratado amplo de investimentos com a Rússia. Esse é o ponto crucial que a mídia, desinformada, não destaca.
O governo Trump e Trump, pessoalmente, têm amplo interesse no sucesso do acordo. Assim como têm interesse na reconstrução de Gaza.
Por conseguinte, a pressão sobre Zelensky será muito forte. Se impuser muitas condições, “melará” um grande negócio, no qual há muito interesse econômico dos EUA envolvido.
Duvidamos que Zelensky, enfraquecido politicamente e militarmente derrotado, tenha condições de modificar, na essência, um acordo que parece interessar tanto aos EUA. Muito provavelmente, vai ter de engolir as cláusulas fundamentais já negociadas entre Putin e Trump.
Putin, estratega, soube explorar esse filão econômico e sua vantagem militar, obtida com muita paciência e inteligência. Já Zelensky, um bobo geopolítico, caiu na conversa mole da Europa e da Otan.
Vai sentar-se no “trono dourado”.
*Marcelo Zero é sociólogo e especialista em Relações Internacionais.
Este artigo não representa obrigatoriamente a opinião do Viomundo.
Publicação de: Viomundo
