Lula, Maduro e oposição: veja repercussões do referendo venezuelano sobre a região de Essequibo, disputada com a Guiana
Os venezuelanos aprovaram a ideia de transformação do território de Essequibo num estado da Venezuela em uma votação ocorrida no domingo (3). Como a consulta teve caráter não-vinculante, o resultado não deve ter consequência prática imediata.
A imensa maioria do eleitorado demonstrou apoiar a reivindicação do governo venezuelano, de incorporar esta região rica em petróleo, que pertence oficialmente à Guiana desde 1899, mas é motivo de uma antiga discórdia. Em 2018, a Guiana levou o caso à Corte Internacional de Justiça, que declarou na semana passada que a Venzuela não deve tomar qualquer atitude que possa modificar a situação atual. Mas a Venezuela não reconhece a competência da corte em Haia para julgar o caso.
Segundo informação divulgada no domingo pelo Conselho Nacional Eleitoral (CNE), 10,5 milhões de eleitores participaram do referendo e 95,93% aceitaram incorporar oficialmente Essequibo ao mapa do país, concedendo cidadania e documento de identidade aos guianenses que vivem no território. Posteriormente, surgiu uma releitura dos dados, segundo a qual esse 10,5 milhões representariam não o total de eleitores, mas de votos em cada uma das cinco perguntas do referendo. O percentual de votos a favor, no entanto, não foi questionado.
Veja a seguir a repercussão do referendo, tanto no que diz respeito à estatística quanto ao resultado, ao mérito da questão e possíveis desdobramentos.
O presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, acha que o país deu os primeiros passos de uma “nova etapa histórica” para lutar pela Guiana Essequiba, pela paz e recuperar o que “os libertadores e libertadoras deixaram para nós”. “O povo falou alto e claro”, declarou no X (antigo Twitter).
Viva la Victoria de todo el Pueblo en un Referéndum Consultivo histórico que ha puesto de pie a Venezuela. Hemos dado los primeros pasos de una nueva etapa histórica para luchar por nuestra Guayana Esequiba, por la Paz y lograr recuperar lo que nos dejaron los libertadores y… pic.twitter.com/mYhYSwuKyi
— Nicolás Maduro (@NicolasMaduro) December 4, 2023
Já o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que espera “bom senso” e teme uma guerra na vizinhança. “Se tem uma coisa que a América do Sul não está precisando agora, é de confusão”, declarou em entrevista coletiva em Dubai no domingo. Lula, que tem insistido no diálogo como saída para a divergência, disse ter conversado por telefone com o presidente da Guiana, Irfaan Ali, e lembrou que o assessor especial da Presidência, Celso Amorim, esteve em Caracas para tratar do tema com o presidente Nicolás Maduro e evitar uma escalada de tensões.
O deputado Jorge Rodríguez, do partido governista PSUV, presidente da Assembleia Nacional da Venezuela, exaltou a participação do povo da Venezuela na construção do seu próprio destino e a disposição do eleitorado para votar no referendo. “Pela primeira vez na história da nossa República, o país decide perguntar ao seu povo sobre o destino da Guiana Essequiba.”
¡Seguimos ejerciendo nuestro derecho! Aún quedan muchos centros abiertos, con una algarabía de una multitud que no se quiere regresar a sus casas hasta emitir su opinión en este referendo histórico. ¡Ha sido una esplendorosa participación del pueblo de Venezuela! pic.twitter.com/DW3Hy0kiCR
— Jorge Rodríguez (@jorgerpsuv) December 4, 2023
Mas Henrique Capriles, líder da oposição venezuelana, questionou os dados apresentados pelo Conselho Nacional Eleitoral (CNE), disse que Maduro perdeu a oportunidade de fazer algo de bom para os venezuelanos e afirmou que o governo nunca fez nada por Essequibo.
Según Elvis Amoroso la participación de hoy (no se atrevió a decirlo) fue 2.110.864 electores. Eran 5 votos por elector. Sin duda nuevamente Maduro convirtió una oportunidad de hacer algo bien con todos los venezolanos en un estruendoso fracaso. Él nunca ha hecho nada por el…
— Henrique Capriles R. (@hcapriles) December 4, 2023
Samuel Braun, professor de Políticas Públicas na UERJ, disse que uma prova de que o referendo foi um sucesso é que, considerando o total de votos afirmativos, a participação popular foi mais de 4 vezes maior que nas recentes prévias eleitorais da oposição. “Em Essequibo, sem tropas, indígenas baixam bandeira da Guiana e hasteiam da Venezuela”, escreveu, junto com um vídeo que mostra esse fato.
10,6 milhões de venezuelanos votaram no referendo (voto facultativo) sobre Esequibo.
Como referência, são mais de 4 vezes a participação nas recentes prévias eleitorais da oposição.
Em Esequibo, sem tropas, indígenas baixam bandeira da Guiana e hasteiam da Venezuela. pic.twitter.com/ZJF0QDNfsL— Samuel Braun ?????????? (@SamuelBraun) December 4, 2023
Eugenio Martínez, jornalista venezuelano, afirmou que a emissora de TV estatal Venezolana de Televisión (VTV), o Canal 8, esclareceu o mistério do CNE, ao mostrar que se tratavam de 10 milhões de votos afirmativos, ou seja, 5 votos “sim” para cada eleitor, o que resultaria numa participação de 2,1 milhões de eleitores.
El canal 8 @VTVcanal8 se encarga de aclarar el misterio del CNE. Según la información que usan en su generador de caracteres se trata de 10 millones de votos afirmativos (suponiendo que todo el mundo votó en las 5 preguntas, entonces la participación fue de 2.1 millones) pic.twitter.com/HmuUD0geps
— Eugenio G. Martínez (@puzkas) December 4, 2023
A própria VTV traz uma declaração de Elvis Amoroso, presidente do CNE. “Uma evidente vitória arrasadora do sim, com participação histórica que supera os 10.554.320 votos”.
#ÚltimoMinuto?| “Una evidente victoria abrumadora del Sí en Venezuela, con una participación histórica que supera los 10.554.320 votos”, enfatizó el Presidente del @cneesvzla, Elvis Amoroso. #VenezuelaDiceSÍ pic.twitter.com/wMdxUTHHdq
— VTV CANAL 8 (@VTVcanal8) December 4, 2023
Oliver Stuenkel, professor de Relações Internacionais na FGV, opinou que a disputa pelo Essequibo pode representar problema para a estabilidade regional, devido ao que considera uma “narrativa agressiva” da Venezuela. Mencionou a possibilidade de uso de força e citou que a Guiana praticamente não tem Forças Armadas, enquanto a Venezuela conta com um operativo militar “sofisticado”.
@oliverstuenkel #venezuela #guyana #essequibo ? original sound – Oliver Stuenkel
Publicação de: Brasil de Fato – Blog