Luís Carlos Bolzan: Contorcionismos da mídia hegemônica mundial para encobrir e apoiar atuação de grupos nazistas na Ucrânia

AS MUITAS FACES DE UM CONFLITO E OS MUITOS CONFLITOS DA MESMA FACE

Por Luís Carlos Bolzan, especial para o Viomundo

O conflito entre Rússia e Ucrânia, para além da triste realidade da guerra para a classe trabalhadora, em benefício dos oligarcas de ocidente e oriente, se mostra muito revelador para todos que têm recursos para discernir além das aparências. Senão vejamos.

A primeira revelação confirma a já muito conhecida expressão de que numa guerra a primeira vítima é a verdade, sendo confirmada pelo consórcio ocidental de propaganda e desinformação em torno do conflito.

Nos grandes meios de comunicação, por mais analistas que se manifestem, fato é que todos e todas concordam no essencial e divergem, quando o fazem, na perfumaria, fazendo com que tudo se legitime pela absoluta e burra unanimidade, censurando a diferença, no modo Pontual de atuação.

Na esteira da primeira revelação, a segunda desmonta a permanente defesa da liberdade de imprensa, dada a decisão da União Europeia de censurar veículos de comunicação russos, como Russia Today e Sputnik, sob alegação de que são “fábricas de mentiras”, quando na verdade, tal atitude revela o quanto a propaganda não tolera o contraditório, característica do bom jornalismo e da democracia verdadeira.

Em clara atitude ditatorial, União Europeia censura veículos de comunicação que não se sujeitam a repetir acriticamente e sem contradita sua versão sobre os fatos, explicitando que a liberdade de imprensa só vale para uma única versão dos fatos, desde que seja “a nossa” e não a “do outro”.

A terceira conclusão aponta para a necessidade diversionista de recorrer ao maniqueísmo num conflito multifatorial, reduzindo todos elementos envolvidos como interesses econômicos, militares, geopolíticos, raciais, religiosos, sociais e históricos ao maniqueísmo entre o “bem e o mal”, sendo o “bem” o ocidente “civilizado” e o “mau” o oriente “incivilizado”.

A mesma conclusão sobre o maniqueísmo nos leva a perceber outro aspecto desse binarismo reducionista, ou seja, a fulanização, com a qual se personifica a disputa entre personalidades. De um lado, pinta-se um Putin como diabólico e autoritário. Do outro, um heroico Zelensky em sua luta patriótica e reativa.

O diversionismo que se utiliza da fulanização cumpre papel de esconder, em primeiro lugar, os elementos estruturais desse conflito, entre eles a excrecência da existência da OTAN mais de trinta anos pós fim do seu equivalente, o Pacto de Varsóvia, e em clara ação expansionista e belicosa contra a Rússia.

Esconde ainda razões de muito sabidas, acalentadas pelo vitorioso ocidente quando da queda do Muro de Berlin, em não apenas conter a Rússia, sua cultura e história, mas de contrapô-la e destruí-la, e, em sequência, a China.

Ainda quanto ao aspecto diversionista da fulanização cabe ressaltar três pontos omitidos:

1. O elemento cultural com ênfase no aspecto religioso, contrapondo cristãos ocidentais católicos e protestantes aos cristãos orientais ortodoxos.

2. A omissão de interesses econômicos de outro nome central do conflito, o do presidente Joe Biden, cujo filho foi diretor da empresa de gás ucraniana após o golpe colorido de 2014 em Maidan, Kiev.

3. O elemento racialista, visto que, apesar de serem brancos envolvidos no conflito, impossível não perceber o desinteresse ocidental com segurança de eslavos incitados ao conflito.

Ou não se materializa aí aspecto da defesa feita pelo ocidente de que Ucrânia, país de cultura marcadamente oriental, faça cavalo de pau histórico e passe a ser o que não é, negando sua história, e tenha governo “pró ocidente”, e não pró população ucraniana?”

O que essa ocidentalização ofereceu aos ucranianos desde a revolução laranja, senão a alcunha de país mais pobre da Europa?

Senão qualidade de vida baixíssima da população imposta pelo receituário do FMI nas últimas duas décadas?

Senão o enriquecimento de pequeno grupo de políticos ucranianos, entre os quais está seu atual presidente Zelensky, pintado como herói pelo ocidente?

Tal ocidentalização imposta aos ucranianos soa como revival de imposição do modo de produção europeu aos povos indígenas americanos, varridos dos EUA, por exemplo, após assumirem forçadamente seu novo modo de vida branco, visto que ameríndios eram tidos como “atrasados” e incivilizados”, se assemelhando ao que dizem alguns jornalistas ocidentais sobre região do conflito e seu povo, como “meio civilizados”.

Na lógica diversionista surge outra revelação importante, dado o contorcionismo da imprensa ocidental em negar ou minimizar a presença de grupos nazistas na Ucrânia. Como isso ocorre?

Primeiro, afirmando que grupos nazistas ucranianos não são nazistas de fato, mas apenas nacionalistas.

Segundo, ao afirmar que, no passado, os representantes desses grupos apoiaram regime nazista, sendo, portanto, colaboradores circunstanciais do nazismo e não nazistas de verdade, como se quem colabora com nazistas não fosse nazista, mas apenas e tão somente um “colaborador”.

Terceiro, omitindo que grupos nazistas — existentes infelizmente em muitos países — estão institucionalizados na Ucrânia, inclusive incorporados às forças armadas ucranianas e equipadas pelo Estado ucraniano.

Quarto, negando o peso de tais grupos na organização social e política ucraniana, afirmando que são parcela diminuta da população da Ucrânia.

Sobre isso é necessário dizer que a população ucraniana não é nazista, tendo imposto nas últimas eleições derrotas ao partido nazista Svoboda. Mas, mesmo assim, os grupos nazistas existentes na Ucrânia exercem significativa pressão social, política e militar, influenciando sobremaneira o quotidiano dos ucranianos.

O consórcio de propaganda ocidental desconsidera documentários que o desmentem, como Máscaras da Revolução exibido na televisão francesa, em 2016.

Esse documentário trata dos grupos nazistas na Ucrânia.

Ele explicita, às vísceras, a relação promíscua entre autoridades dos EUA e europeias com grupos nazistas ucranianos.

E prova que autoridades ocidentais sabiam desses grupos e de sua natureza nazista, e mesmo assim os apoiaram.
Em linha semelhante, há   Ucrânia em Chamas, do cineasta Oliver Stone.

Esse documentário mostra como a revolução colorida foi mais um golpe contra população, já que o movimento das ruas em Kiev, em 2014, foi dominado pelos grupos terroristas nazistas.

Assim, outra conclusão se materializa: a opção do grande consórcio de propaganda ocidental com seus veículos de grande imprensa em ocultar nazistas na Ucrânia e, por consequência, apoiá-los.

Esse modus operandi da mídia visa a esconder as íntimas relações do ocidente com tais grupos em inequívoca parceria contra seu adversário russo, já que esses grupos nazistas são sobretudo, antirussos. E, ao apoiar tais grupos, o consórcio de propaganda ocidental intensifica seu discurso russofóbico.

Tal revelação nos mostra que, para combater o oriente representado pela Rússia, o ocidente faz alianças com nazistas, tentando constrangidamente negá-las de várias formas. Omitem do noticiário esse apoio, minimizam e negam existência de grupos nazistas na Ucrânia, ou ainda apelam para discurso diversionista acusando de “propaganda russa” quem denuncia o conluio.

Os que hoje apoiam nazistas não poderão depois se dizer surpresos ou arrependidos, pois o fazem de maneira consciente.

Outra revelação, mas não menos importante, é o fato de que guerras em território europeu ou no hemisfério norte causam comoção jamais vista diante da indiferença das guerras no sul ou no oriente, como se humanos ocidentais do hemisfério norte fossem mais importantes do que os de outras regiões, culturas e cores.

Prova disso é a diferença no tratamento dado pela Europa a refugiados da Síria ou da Líbia, por exemplo, e o tratamento dado a refugiados da Ucrânia, com exceção para negros e negras que vivem na Ucrânia, que têm sido barrados nas fronteiras, em clara demonstração de racismo.

Por fim, a triste revelação da postura parcial de entidades, como FIFA e COI, que puniram atletas russos pela guerra, mas não o fizeram contra atletas americanos, quando os EUA invadiram Iraque e Afeganistão. Ou quando a OTAN, sem autorização do Conselho de Segurança da ONU, bombardeou a Sérvia, matando milhares de civis.

Demonstração inequívoca da parcialidade dessas entidades e de que os ataques dos EUA serão sempre apoiados, mesmo com base em mentiras, como no caso do Iraque.

Essa guerra é um conflito entre semelhantes representantes do mesmo modo de produção capitalista, cristãos, brancos do hemisfério norte, e impérios militares, um em franca ação de expansão e outro em iniciativa de evitar tal expansão.

Não há luta entre modos distintos de produção. São as muitas faces de um conflito com os muitos conflitos da mesma face, a face do capital e seu modo de produção.

Putin não é de esquerda e Zelensky não é herói, tanto quanto Biden não é libertador nem democrata ou desinteressado. Todos de espectro político à direita, sustentados por oligarcas e apoiadores de interesses desses oligarcas cleptocratas em suas plutocracias.

A guerra é parteira de mudanças ao longo da história, mas não mudanças que dialogam com interesses da classe trabalhadora, pois as vidas ceifadas na guerra são a de trabalhadores e trabalhadoras.

O capital sabe disso, por isso fomenta guerras para mudanças geográficas, geopolíticas, econômicas, cosméticas em geral, visto que nunca ameaçam a reprodução sistêmica do capital.

Não é um FlaFlu ou Grenal. É uma guerra que, como tantas outras, diz mais sobre quem a insufla, e nada sobre quem nela sofre e morre.

Assumir lado como quem escolhe time é reduzir conflito complexo para trocar seis por meia dúzia, que não são iguais, mas semelhantes, visto que suas diferenças não são estruturantes.

A superação do status quo que oprime a classe trabalhadora não pode vir da essência do modo de produção capitalista com sua violência estrutural, mas da construção material legítima dos interesses da classe trabalhadora ao negar a reprodução metabólica do capital e suas diversas manifestações de violência.

A Rússia deve aceitar o expansionismo belicoso da OTAN apoiada em grupos nazistas antirrussos? Não!

Mas a opção pela guerra e invasão é uma não opção, dado que a Rússia não é um país despreparado, passando assim a dar o passo militar esperado e provocado pelo Ocidente.

Guerras não incluem, matam.

Guerras não somam, subtraem.

Guerras não aproximam, afastam.

Guerras não curam, fazem sofrer e criam feridas que não cicatrizam.

Guerra, não. Mudanças, sim.

Mudanças pela paz, pela vida, pelo respeito às diferenças e aos diferentes

*Luís Carlos Bolzan é psicólogo.

Leia também:

Ângela Carrato: Na defesa cega de EUA-Otan-Ucrânia, mídia brasileira mente e presta desserviço ao País

Jornalista denuncia guerra suja da mídia pró-EUA em favor das forças neonazistas na Ucrânia

Bando de ucranazis, palhaço e ex-miss desafiam uma potência nuclear. É sério isso?

Um diplomata americano veterano e sua visão pró-Rússia no conflito com a Ucrânia

José Luís Fiori: A guerra na Ucrânia e seus efeitos na Europa, Rússia, EUA e China

Porta-voz do governo chinês lista 64 intervenções dos EUA: “A História não esquece”

Lelê Teles: Jornalistas europeus exibem racismo velho de guerra na Ucrânia

Publicação de: Viomundo

Lunes Senes

Colaborador Convidado

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *