Deslizamento de mina expõe fragilidade do modelo de mineração em Conceição do Pará (MG)

A cidade de Conceição do Pará, no Centro-Oeste de Minas Gerais, vive momentos de apreensão desde o sábado (7), quando um deslizamento de uma pilha de rejeitos ocorreu na Mina Turmalina, operada pela Jaguar Mining. O incidente mobilizou autoridades, afetou diretamente a comunidade de Casquilho de Cima e levantou questionamentos sobre a segurança da mineração na região.

Segundo o Corpo de Bombeiros, até esta quarta-feira (11), 207 pessoas foram evacuadas, sendo 75 famílias encaminhadas para hotéis ou casas de familiares. Além disso, 120 imóveis foram desocupados, dos quais sete foram diretamente atingidos. 

Mais de 670 animais também precisaram ser resgatados. As operações de resgate e contenção continuam com apoio de um “Comando Unificado de Operações”, que reúne representantes da Jaguar Mining, Defesa Civil, Corpo de Bombeiros, Polícia Militar e órgãos municipais e estaduais.

Causas e impactos sob investigação

O deslizamento da pilha Satinoco, que contém rejeitos sólidos oriundos da exploração de ouro, percorreu cerca de 500 metros, atingindo áreas próximas à comunidade rural. Apesar de não haver registro de feridos, os danos materiais e ambientais são graves, de acordo com especialistas.

O Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) destacou que sedimentos contaminados com metais pesados podem ter causado danos irreparáveis ao solo e às águas da região, com consequências para a agricultura e a saúde pública.

O MPMG instaurou uma ação civil pública solicitando a suspensão imediata das atividades na mina até que auditorias independentes comprovem a segurança das estruturas. Além disso, requereu o bloqueio de R$ 200 milhões da Jaguar Mining para custear medidas emergenciais e a recuperação ambiental.

Críticas ao modelo minerador

Para Luiz Paulo Siqueira, coordenador do Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM), o incidente evidencia a precariedade das chamadas pilhas de rejeitos, amplamente utilizadas após a proibição de novas barragens com rejeitos líquidos. Ele alertou para a falta de informações claras sobre a composição dos materiais que vazaram e destacou os riscos de contaminação a longo prazo para o meio ambiente e a saúde humana.

“Estamos falando de uma comunidade rural que depende do solo para sua subsistência. Os metais pesados presentes nesses rejeitos podem causar danos graves, como doenças crônicas e aumento de casos de câncer”, afirmou Luiz Paulo.

Ele também criticou a ausência de transparência por parte da mineradora e de órgãos reguladores como a Agência Nacional de Mineração (ANM). 

“Não há garantia de segurança nesse modelo de mineração expansionista, que prioriza o lucro em detrimento da vida e do meio ambiente”, concluiu.

Respostas da Jaguar Mining

Em nota, a Jaguar Mining informou que criou canais de atendimento para moradores e reforçou o pedido para que as pessoas não retornem às áreas interditadas. A empresa também anunciou a instalação de equipamentos de monitoramento e a construção de estruturas de contenção para evitar novos incidentes, mas admitiu que a área acima da pilha permanece instável.

A Jaguar informou que as famílias evacuadas estão recebendo hospedagem e suporte, mas relatos da comunidade indicam falhas na assistência, como alimentação inadequada e incerteza sobre a duração do abrigo. 

“As famílias não sabem se poderão passar o Natal em segurança”, comentou o coordenador do MAM, ressaltando que os hotéis estão com alta ocupação devido ao período de festas.

Ações judiciais e próximos passos

Na terça-feira (10), a Justiça acatou parcialmente os pedidos do MPMG, determinando o pagamento de R$ 10 mil por núcleo familiar deslocado, além de valores mensais, enquanto durar a evacuação. A decisão também exige a implementação de um plano de comunicação para a comunidade e medidas emergenciais para mitigar os danos socioambientais.

Enquanto isso, as investigações sobre as causas do deslizamento continuam. O Ministério Público também instaurou procedimento criminal para apurar responsabilidades e possíveis crimes ambientais e socioeconômicos.

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O caso de Conceição do Pará reacende o debate sobre os impactos do modelo minerador em Minas Gerais. Para o MAM e outras organizações, é urgente repensar a relação entre mineração e comunidades, colocando os direitos humanos e a proteção ambiental acima dos interesses econômicos.

“Esse desastre poderia ter sido muito pior se tivesse ocorrido à noite ou em período chuvoso”, alerta Luiz Paulo Siqueira. “É hora de nacionalizar os bens minerais e adotar um modelo que sirva ao povo, não ao capital”, enfatizou.

Desdobramentos na Assembleia Legislativa 

A deputada estadual Beatriz Cerqueira (PT) apresentou o projeto de lei (PL) 2.519/24, que busca criar uma política de fiscalização para pilhas de rejeitos e resíduos da mineração em Minas Gerais. A proposta prevê medidas de segurança, fiscalização e maior transparência das informações sobre essas estruturas, para evitar casos como o de Conceição do Pará. 

O projeto visa prevenir acidentes como deslizamentos e desmoronamentos, protegendo o meio ambiente, a população e a infraestrutura pública. Ele responsabiliza as mineradoras pela segurança em todas as fases de operação e obriga a comunicação imediata em casos de risco.

A matéria foi analisada na Comissão de Constituição e Justiça da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, mas não avançou devido à solicitação de diligências pelo relator Charles Santos (Republicanos).

Publicação de: Brasil de Fato – Blog

Lunes Senes

Colaborador Convidado

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