Cozinha comunitária em construção é destruída no DF em ação da Secretaria de Proteção da Ordem Urbanística
O espaço em construção da cozinha-escola Favela Gastronômica, um projeto de cozinha comunitária, foi destruído durante ação da Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF) e do DF Legal na manhã de sexta-feira (24), no Bairro de Fátima, em Planaltina, região administrativa do Distrito Federal. Segundo informações dos integrantes do Favela Gastronômica, a operação foi realizada sem mandato ou trâmite administrativo e jurídico correto.
A ação iniciou por volta das 10h, quando a PM chegou à ocupação. O episódio, de acordo com integrantes do projeto, teria sido motivado por uma perseguição à liderança comunitária Cleide Morais e ao desenvolvimento cultural e soberano da comunidade de ocupação Bairro de Fátima em Planaltina, acreditam os integrantes do projeto.
“Por volta das 10 horas da manhã, começou uma derrubada aqui no bairro e cortaram a nossa energia”, diz Cleide Morais, coordenadora e idealizadora da iniciativa. “Foi uma denúncia, claramente. Foram direto no nosso projeto e derrubaram a nossa escola que a gente estava terminando de construir. Precisamos da ajuda de todo mundo nesse momento para tentar reverter essa situação, entrar com mandado de segurança, uma liminar e também na reconstrução da escola”, lamenta.
A ação foi realizada sem mandado. Ainda de acordo com informado pelos integrantes do Favela Gastronômica, a PMDF e o DF Legal foram “só para derrubar a escola e nada mais. Não apresentaram a denúncia do SEI, que alegaram ser o motivo da derrubada”.
Em live realizada no Instagram da Favela Gastronômica na hora da ação, integrantes lamentaram a derrubada do espaço. “Um absurdo, gente. Foi denunciado o que está sendo construindo na Favela Gastronômica aqui no bairro de Fátima. Estão derrubando, estão fazendo a derrubada aqui por conta de denúncia de gente mal intencionada, uma coisa que era para benefício da comunidade e estão derrubando por conta de denúncia”, mostra vídeo.
Ao Brasil de Fato DF, o DF Legal informou que a operação teve como alvo um parcelamento irregular instalado recentemente dentro do perímetro de segurança da Unidade de Internação de Planaltina (UIP).
“Tendo em vista a necessidade de manter o perímetro de um quilômetro sem construções em torno da Unidade para garantir a segurança dos servidores e adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa, a ação se fez necessária”, mostra nota.
O DF Legal afirma que foram desconstituídos cerca de dois quilômetros de cercamento e sete edificações. “Vale destacar que todas as edificações precárias foram instaladas recentemente e que a área já foi alvo de diversas ações da pasta ao longo dos últimos anos. A última delas ocorreu em 2022 com a remoção de mais de 50 estruturas precárias e 2,5 quilômetros de cercamento irregular”, diz a pasta.
Já a Polícia Militar do Distrito Federal afirmou que não realiza ações de derrubada ou reintegração de posse. “A atuação da corporação, nestes casos, limita-se a garantir a integridade física e a segurança de todas as pessoas presentes no local, incluindo servidores do DF Legal, Oficiais de Justiça, funcionários da Novacap, ou outros órgãos envolvidos”, diz nota da PMDF.
Prêmio Periferia Viva
O espaço da cozinha-escola era construído com recursos do Prêmio Periferia Viva 2024, iniciativa do Ministério das Cidades, através da Secretaria Nacional de Periferias, e que tem como objetivo reconhecer, valorizar, potencializar e premiar iniciativas populares que potencializem a transformação de territórios periféricos.
Durante a ação, moradores pediram para que, ao menos, os materiais de construção fossem retirados antes da demolição. O valor do prêmio foi de R$ 100 mil e o espaço estava previsto para ser inaugurado em junho deste ano.
De acordo com a coordenação do Favela Gastronômica, o projeto, lançado em agosto de 2024, visa promover mudanças estruturais, e estabelecer processos democráticos, com a participação plena da comunidade. Para isso, coletam e distribuem alimentos que seriam descartados, promovem cursos de aproveitamento integral de frutas, verduras e legumes, implantam hortas comunitárias, conhecimentos ancestrais para uso de plantas e remédios da natureza.
“Essa obra foi construída com recursos públicos do prêmio Periferia Viva (maior incentivo a favelas da história do governo brasileiro) e representa um enorme prejuízo para a concretização da política pública”, mostra nota do projeto. “A obra representava em um passo importante para o desenvolvimento cultural e a soberania alimentar da ocupação”.
Ao todo, o DF tem 62 áreas mapeadas como periféricas, favelas e comunidades urbanas, incluindo a maior favela do País, o Sol Nascente, segundo dados do Censo 2022, divulgados em outubro. Ainda de acordo com o levantamento, 6,3% da população da capital vive em favelas, ou seja, 198.779 pessoas.
Os projetos que foram premiados estão localizados na região do entorno Cidade Estrutural, Taguatinga, Planaltina e Samambaia e são, em sua maioria, espaços e bairros oriundos de ocupações.
Publicação de: Brasil de Fato – Blog